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Tráfico de escravos

Termo de contagem de escravos transportados de Angola para o Rio de Janeiro no bergantim Amizade. Rio de Janeiro, 23 de maio de 1808. Diversos – SDH – códices. BR RJANRIO NP.COD.242.v1

Uma das atividades econômicas mais lucrativas do período colonial, o tráfico de escravos oriundos da África foi responsável pela entrada de mais de 4 milhões de africanos no Brasil durante cerca de três séculos (Hebert Klein. A demografia do tráfico atlântico de para o Brasil. Estudos econômicos. Maio/ agosto, 1987). Alimentando-se de prisioneiros das guerras étnicas e, posteriormente, tribais que assolavam os reinos africanos, a procura por cativos foi fomentada pela expansão colonial baseada no sistema de plantation, dominante nas Américas, que se apoiava na mão-de-obra escrava. A pressão europeia pelo fornecimento de mercadoria humana levou à um crescimento exponencial da escravidão no continente. O tráfico negreiro resultou no chamado comércio triangular que envolvia África, Europa e América, integrados em um sistema de comercialização de diferentes tipos de riqueza: os escravos africanos, normalmente empregados nas grandes plantações de caféaçúcar e algodão da América, eram trocados por tabaco, tecido, cachaça, rum ou armas na costa africana, ao longo da qual várias nações europeias acabaram estabelecendo feitorias para viabilizar o comércio. Transportados em navios tumbeiros ou negreiros, os escravos provinham principalmente do Senegal, da Gâmbia, da Costa do Ouro e da Costa dos Escravos, durante os séculos XVII e XVIII e do delta do Níger, do Congo e de Angola nos séculos XVIII e XIX. De acordo com os dados da The Trans-Atlantic Slave Trade Database – portal internacional de catalogação de dados sobre o tráfico atlântico –, navios portugueses ou brasileiros embarcaram escravos em quase 90 portos africanos, fazendo mais de 11,4 mil viagens negreiras. Dessas, 9,2 mil tiveram como destino o Brasil. A atividade mercantil teve sua expansão inicial entre os séculos XV e XVI – os primeiros escravos africanos chegaram ao Brasil com a expedição de Martim Afonso de Souza em 1530, vindos da Guiné e, em 1568, o governador-geral Salvador de Sá tornou-a oficial. Mas, foi entre os anos de 1750 e 1850, que o tráfico negreiro conheceu seu auge e teve como principal porto importador a cidade do Rio de Janeiro, sobretudo em função da necessidade de abastecimento da região das minas. O comércio de homens mulheres e crianças, tornava-se objeto de dupla exploração: a “mercadorização”, através do tráfico atlântico e a expropriação de sua força de trabalho dentro do sistema escravagista colonial nas Américas, gerando lucros extraordinários, apesar do custo elevado, das “perdas em trânsito”, como diria Manolo Fiorentino, referindo-se aos diversos riscos que envolviam a travessia atlântica (pirataria, epidemias, naufrágios) e das dificuldades para administrar tal atividade, sobretudo pela resistência africana a esse processo de coisificação (Maria Jorge dos Santos Leite. Tráfico Atlântico, Escravidão e Resistência no Brasil. Revista de História da África e de Estudos da Diáspora Africana. Agosto de 2017). Os traficantes de escravos, conhecidos como homens de negócios, foram os grandes beneficiários da atividade, tornando-se a elite econômica colonial, mas que precisavam recorrer a relações sociais mais amplas, tanto na metrópole quanto na América e na África, indispensáveis para o funcionamento do comércio atlântico de escravos. Segundo Jaime Rodrigues, o tráfico de escravos envolveu não apenas os africanos escravizados, mas toda uma rede formada por negociantes, feirantes, oficiais e marinheiros comuns, autoridades administrativas e colonos. (De costa a costa: escravos e tripulantes no tráfico negreiro. Rio de Janeiro/ São Paulo: Companhia das letras, 2005). Esse comércio de almas, foi, durante séculos tido como algo natural e justificado tanto economicamente quanto pela religião, que enxergava o processo de escravização como uma forma de levar a fé católica à povos infiéis. No entanto, no alvorecer do século XIX, filósofos liberais colocariam em debate a escravidão, iniciando uma intensa campanha abolicionista, liderada pela Inglaterra. Apesar das pressões britânicas pelo fim do comércio atlântico de escravos, que resultou na assinatura de diversos tratados abolindo a importação de africanos, como a lei Feijó de 1831, mas que seriam apenas “para inglês ver”, o tráfico negreiro, atividade econômica basilar no Brasil colonial, resistiria ainda meio século, mantendo-se, durante alguns anos, na clandestinidade após a proibição do tráfico de escravos em 1850.