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Irmãos pretos

As associações religiosas formadas por leigos desempenharam um papel muito importante na vida dos negros e seus descendentes no Brasil, o que é mais explícito no caso das irmandades. Estas se organizavam geralmente em torno da devoção a um santo, entretanto podiam funcionar ainda como associações de classe, profissão, “cor” e nacionalidade. Na colônia, existiram, portanto, irmandades de brancos, negros e mulatos. Tais associações possuíam um caráter de ajuda mútua, promovendo assistência material em vida e na morte aos seus membros, como era o caso da compra de alforrias. Proporcionavam a convivência de indivíduos de diversas origens sociais e representavam garantia de inserção social e de proteção, principalmente para os segmentos menos favorecidos. Pertencer a uma dessas associações significava dar legitimidade às práticas religiosas, contar com auxílio para as eventuais dificuldades da vida, garantir o sepultamento e a celebração de missas pelas almas. Outro fator positivo era a intensa vida social, como as festas promovidas em homenagem aos santos padroeiros ou de devoção. Acredita-se que as irmandades tenham servido de instrumento para que os africanos e os seus descendentes pudessem manter e transmitir as suas tradições, fazer contatos frequentes e preservar as suas línguas de origem. As ordens terceiras diferenciavam-se das irmandades por estarem subordinadas às tradicionais ordens religiosas de origem medieval. Como as exigências para a entrada em uma ordem terceira baseavam-se nos critérios de pureza étnica, excluía-se a participação de negros e seus descendentes. Entretanto, na prática, a obediência a esses critérios não parece ter sido tão rígida no caso brasileiro. No período pombalino, no bojo das reformas de caráter ilustrado, observa-se uma série de alterações na legislação como a revisão de critérios tradicionais de limpeza de sangue. Assim, no ano de 1773, foi anulada a distinção entre cristãos-novos e cristãos-velhos, e determinado que os escravos residentes em Portugal que se encontravam na quarta geração de cativeiro e os que nascessem a partir da publicação da lei, e estivessem na terceira geração, seriam libertados. Os agraciados pela lei estariam automaticamente habilitados ao exercício de todos os ofícios e honras da monarquia, não pesando mais sobre eles a nota de “infâmia”. Na América portuguesa, o conhecimento dessas novas leis implicou no questionamento da antiga legislação discriminatória, o que permitiu, em alguns casos, a participação de negros e seus descendentes nas ordens terceiras.