Registro de requerimento de Joana Rosa da tutoria dos filhos que teve com Francisco da Cunha e Menezes, governador da Índia e sogro do barão de Manique. Os filhos de Francisco da Cunha e Menezes haviam sido dados ao barão de Manique, que assumiu a tutoria dos irmãos ilegítimos de sua mulher. Em resposta, a Mesa do Desembargo resolve que uma mulher da condição de Joana Rosa, "mãe natural", não poderia nesse caso assumir a tutoria dos filhos que tinham como pai um fidalgo com tantos serviços prestados à Coroa. Com o fim de evitar qualquer constrangimento ao barão de Manique, a Mesa recomenda a indicação de novo tutor.
Conjunto documental: Livros de consultas da Mesa do Desembargo do Paço
Notação: códice 250, vol. 2
Datas-limite: 1814-1816
Título do fundo ou coleção: Negócios de Portugal
Código do fundo ou coleção: 59
Argumento da pesquisa: população, órfãos
Data do documento: 12 de setembro de 1814
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 80v
Sobre o requerimento de dona Joana Rosa em que quer se lhe confira a tutoria dos filhos naturais[1] que teve de Francisco da Cunha e Meneses[2] que se havia dado ao barão de Manique[3] do Intendente, cunhado dos mesmos menores.
Parece à Mesa[4] que posto que algumas vezes se tenha conferido as mães naturais a tutela de seus filhos ilegítimos[5], na falta de parentes capazes para dela serem encarregados, e isto na classe de pessoas que não pertencem a ordem de conhecida nobreza, porque pela ordem Lº 4º, t º2 [fl] 83º, somente são chamadas para a tutela[6] dos filhos as mães ou avós legítimas, tendo os requisitos determinados na mesma lei, contudo estes exemplos não habilitam a suplicante para ser tutora de seus filhos, que estando como estão legitimados a requerimento de seu pai, pertencem pela legitimação à sua ilustre família e por isso seria muito indecoroso que uma mulher da condição da suplicante fosse a tutora dos filhos de um fidalgo da primeira Nobreza[7] e Ordem da Grandeza deste reino, e que teve tanta representação nos eminentes lugares que Sua Alteza Real[8] lhe confiou tanto neste reino como nos seus domínios ultramarinos: também lhe não confere direito algum para a mesma tutela a cláusula que com excesso dos poderes conferidos pelo pai dos menores na sua procuração se escreveu na escritura da doação dos limitados bens, que pouco excedem o valor de três contos de reis, de que o suplicante os administrasse durante a menoridade dos filhos donatários, e que o mesmo doador sendo perguntado na forma da lei, para declarar se era contente, que se confirmasse a doação, ratificasse a mesma escritura, já porque esta ratificação somente tinha por objeto a insinuação da doação, e já porque a referida cláusula, quando fosse derivada da vontade do doador, não se pode considerar, como nomeação de tutora, pois que ainda que houvesse essa nomeação em testamento, como era para a tutela e filhos naturais, e não legítimos, necessitava de ser confirmada pelo respectivo juiz dos Órfãos[9] na conformidade da dita ordenação [ilegível], se a pessoa nomeada, fosse para essa pertencente na frase da mesma lei, cujos requisitos não tem a suplicante devendo por consequência ser escusado o seu requerimento. E para evitar todo o escrúpulo e cessarem as imputações que se fazem ao barão do Manique, tutor atual, será conveniente que Sua Alteza Real seja servido ordenar, que o provedor dos Órfãos e Capelas[10], da Classe dos Estranhos, nomeie tutor, que seja capaz para a mesma tutela. Lisboa 17 de janeiro de 1814.
S.A.R. = Como parece = Palácio do Rio de Janeiro 12 de setembro de 1814.
[1] A legislação portuguesa estabelecida nas Ordenações Filipinas seguia o modelo do direito romano, em combinação com o direito canônico, a respeito do que seriam os filhos naturais e o papel e direitos destes na sociedade. Esses se opunham aos filhos adotados ou também chamados “de criação”, eram filhos biológicos de um casal. Por sua vez, os filhos naturais poderiam se dividir entre legítimos, legitimados ou ilegítimos. Os primeiros seriam os concebidos e nascidos de pais casados perante a Igreja Católica, sem impedimentos legais ou morais. Os ilegítimos naturais eram os filhos que foram concebidos por pais sem impedimentos legais para o casamento, não eram adúlteros ou aparentados, mas não eram casados (viúvos ou solteiros), o que os tornava moralmente indesejados pelas famílias. Estes filhos poderiam ser legitimados pelo matrimônio do casal ou pelo reconhecimento de, pelo menos, um dos pais, o que chegaria a torná-los herdeiros de alguns bens. De acordo com as normas cristãs, os pais eram obrigados a assegurar-lhes o sustento e cuidados mínimos. Eram normalmente mencionados em testamento, embora dificilmente tivessem os mesmos direitos e atenções recebidos pelos filhos legítimos, embora chegassem às vezes a receber terras, cargos militares de elevada patente, ingressar no serviço eclesiástico e até obter cargos e títulos de menor porte. Às filhas, eram assegurados casamentos em famílias de menor importância, mas ainda assim, “bons casamentos”, ou eram destinadas aos recolhimentos e à vida religiosa.
[2] Militar português, foi governador e capitão-general da capitania de São Paulo entre 1782 e 1786, da Índia nos anos de 1786 a 1794 e da Bahia no período de 1802 a 1805. Quando foi governador da Índia, abriu devassa para apurar uma denúncia de levante em Goa em 1787, conhecida como a Sublevação dos Pintos, que, como a inconfidência mineira, não chegou a acontecer, sendo sufocada antes. Em 1807, o regente d. João o elevou a tenente-general e o nomeou para seu Conselho de Guerra. Neste mesmo ano, foi indicado para o Conselho de Regência de Portugal, que governou o reino no lugar do príncipe e da rainha, quando ambos seguiram para o Brasil com o restante da Corte. Os membros do Conselho de Regência foram também os responsáveis por coordenar as ações de guerra contra as tropas napoleônicas auxiliados pelos britânicos. Cunha de Menezes exerceu, ainda, o cargo de presidente da Mesa do Desembargo do Paço, foi fidalgo da Casa Real e comendador da Ordem de Cristo. Embora não tenha se casado, deixou uma filha natural legitimada por ele e que levou seu nome, Maria da Glória da Cunha e Menezes, que se casou com o barão de Pina Manique. O requerimento de Joana Rosa, retirado do livro de consultas da Mesa do Desembargo do Paço aponta para a existência de outros dois filhos naturais de Menezes, mas que não foram legitimados por este em vida. Faleceu ainda exercendo o governo provisório de Portugal.
[3] 2º senhor, 1º barão e 1º visconde de Manique do Intendente, Conselheiro do Rei, membro do Conselho Ultramarino, desembargador da Relação do Porto. Português, filho do célebre intendente de Polícia de Lisboa, Diogo de Pina Manique. Casou-se com d. Maria da Glória de Cunha Menezes, nascida em São Paulo, filha natural e legitimada de Francisco da Cunha e Menezes, governador e capitão-general dessa capitania, das Índias e da Bahia. Pina Manique ainda ocupou o cargo de deputado da Mesa de Consciência e Ordens, foi comendador da Ordem de Cristo e sucedeu o pai como alcaide-mor do distrito de Portalegre (Lisboa). Membro de uma das mais distintas famílias de Portugal, que prestaram grandes serviços à Coroa, recebeu os títulos de barão em 1801, concedido por d. Maria I, e de visconde em 1818, pelo já rei d. João VI.
[4] Criada no Rio de Janeiro, após a transferência da Corte portuguesa ao Brasil, pelo alvará de 22 de abril de 1808, era um órgão superior da administração judiciária. O recém-criado tribunal encarregava-se dos negócios que, em Portugal, pertenciam a quatro secretarias: os tribunais da Mesa do Desembargo do Paço, da Mesa da Consciência e Ordens, do Conselho do Ultramar e da Chancelaria-Mor da Corte e do Reino. O alvará de criação do Desembargo do Paço e da Mesa da Consciência e Ordens, definia ambos como um mesmo tribunal, no entanto, na prática, mantiveram funcionamento e normas distintas. Referente ao Conselho Ultramarino, sua jurisdição englobava apenas os temas que não fossem militares, uma vez que estes já eram contemplados pelo Supremo Conselho Militar, uma de suas atribuições foi a confirmação das sesmarias da Corte e província do Rio de Janeiro, que até então eram dadas pelos vice-reis, pelos governadores e pelos capitães-generais de diversas capitanias.
[5] Comuns na vida familiar do mundo luso-brasileiro foram mais frequentes na colônia do que na metrópole. No Brasil, entre um terço e metade das crianças batizadas (sem considerar as que nasciam e não chegavam a sê-lo) eram tidas como ilegítimas e ocorriam tanto nas famílias mais pobres, quanto nas mais abastadas e bem-nascidas. De fato, a ilegitimidade era vista de modo diferente entre homens e mulheres, ricos e pobres. Os filhos ilegítimos eram aqueles gerados fora do casamento religioso, e havia uma divisão e distinção importante entre eles. Havia os ilegítimos “naturais”, aqueles gerados por casais não ligados pelo matrimônio, mas não impedidos para tanto, ou seja, solteiros ou viúvos, que por vezes eram legitimados, registrados e reconhecidos pelos pais, na maior parte das vezes, para fins de continuação do nome e de herança. No entanto, os mais frequentes eram os ilegítimos gerados de relações que impediam o casamento, fosse por adultério, por razões eclesiásticas ou por relações incestuosas. Os “filhos de danado coito”, como eram também chamados, dificilmente seriam reconhecidos pelos pais, pois eram frutos de relações moralmente reprovadas e até mesmo de crimes, no caso do adultério. Muitos desses ilegítimos “espúrios” eram filhos de escravas, criadas ou mulheres livres e pobres com homens e senhores casados e também filhos de mulheres casadas com amantes. O destino destes era quase sempre os hospitais, as casas de assistência pública e as rodas de expostos e, quase nunca, chegavam a saber quem eram os pais, especialmente as mães, já que entre as mulheres, ainda mais das camadas mais altas, ter filhos ilegítimos não naturais era falta grave e poderia resultar em punições fatais. Entre os homens de posses, a ilegitimidade, embora moralmente condenada, era socialmente tolerada, reflexo de uma sociedade patriarcal na qual a promiscuidade masculina era considerada até certo ponto “normal”. Os ilegítimos naturais eram mais reconhecidos pelos pais, mesmo os frutos de relações inter-raciais. Apenas uma minoria chegava a herdar bens e ascender socialmente, evidenciando uma tendência da sociedade colonial de ser mais tolerante com este comportamento do que a metrópole. Durante muito tempo, a necessidade de povoar o território e de ter mais braços para o trabalho fez com que esta prática fosse bastante disseminada. Em Portugal, no entanto, os processos de legitimação eram mais complexos, por envolver heranças de terras, senhorios, títulos e cargos no governo, e eram solicitados diretamente à Coroa, que expedia cartas régias de legitimação, desde que de filhos naturais e não espúrios. Entre os mais pobres, a legitimação era mais fácil de ser aceita, já que as questões de herança não eram um problema, e os braços a mais para o trabalho eram mais necessários. Para a população feminina escrava os filhos ilegítimos frutos de relações com os senhores podiam representar uma vida diferente para a criança, que apesar de seguir a condição do ventre da mãe, poderia ser libertada pelo pai, ou até mesmo ser dada como livre, se exposta à Misericórdia, já que todas as crianças recolhidas, mesmo as de cor, eram automaticamente tidas como livres.
[6] A função do tutor no mundo luso-brasileiro foi compilada pela primeira vez em lei nas Ordenações Afonsinas entre 1446 e 1448, muito inspiradas pelo direito romano. Tais ordenações tratavam dos encargos e obrigações dos tutores – então chamados guardadores – e estabeleceram as bases do que se firmou com as Ordenações Filipinas em 1603. Nesta compilação, os termos tutor e curador aparecem como sinônimos, ao passo que guardador cai em desuso. A diferença entre o tutor e o curador, estabelecida pelo direito romano, previa que o primeiro fosse responsável pela pessoa do órfão ou incapaz e, o segundo, se ocupasse dos bens do mesmo. Na prática, no Império português, os dois termos eram usados para designar a mesma pessoa e as funções se sobrepunham, sendo, basicamente, “promover com zelo e exatidão em favor de pessoa impedida o negócio que lhe é encarregado”, podendo ser órfão, idoso ou deficiente. Os tutores eram responsáveis por prover educação e subsistência aos órfãos, cuidar de seus bens até que estes atingissem a maioridade (25 anos), garantindo o retorno do patrimônio inalterado com os rendimentos previstos ao legítimo dono, e até mesmo, promover e autorizar o casamento dos menores de idade. Não era raro que irmãos pudessem ter tutores diferentes ou que um mesmo órfão tivesse mais de um curador, caso herdasse bens imóveis em mais de uma região no Reino, ficando cada um responsável por uma localidade. Os tutores poderiam ser uma pessoa indicada pelo pai ou pelo avô no testamento, normalmente da família, mas não obrigatoriamente, chamado tutor testamentário. Poderiam ser também, parentes próximos homens, salvo poucas exceções, possuidores de posses e capazes de gerir os bens dos órfãos sem prejuízo a eles, chamados tutores legítimos. Ainda existiam os tutores dativos: pessoas indicadas para a função pelos alcaides e alvasis, que atuavam como juízes no âmbito municipal, até a criação do cargo de juiz de órfãos pelo Código Filipino, que passou a ser o encarregado de nomear e confirmar tutores, bem como de fiscalizá-los. Embora a lei previsse penas muito duras aos tutores que não cumprissem com suas obrigações ou negligenciassem o cuidado com os órfãos e seus bens, havia muitos casos não previstos que eram encaminhados diretamente aos secretários de Estado e ao próprio monarca, como no caso de troca de tutor ou curador, ou mesmo substituição no caso de falecimento ou incapacidade deste. Caso a mãe morresse, a tutela era automaticamente revertida ao pai, que se tornava curador dos bens dos filhos. No caso de o pai falecer, o órfão poderia ficar com a mãe legítima e natural, caso esta não se casasse novamente. Se contraísse matrimônio, automaticamente perdia o direito à tutela dos filhos, que passavam a algum parente mais próximo, preferencialmente o avô, e depois a outros familiares mais próximos ao órfão. Ao longo do século XIX, houve forte pressão de advogados e juízes para que a tutela do órfão seguisse naturalmente para a mãe, e somente na incapacidade desta, para avós ou outros parentes, o que somente se concretizou amplamente no Brasil com a criação do Código Civil em 1916, já no período republicano.
[7] A ideia de nobreza está relacionada à distinção garantida por costumes e por lei, que diferencia os indivíduos nas sociedades de corte, pertencentes a certas famílias e com funções de mando, daqueles que executavam os trabalhos físicos, considerados a plebe, e dos religiosos. Essa distinção perpetuava a estrutura estamental herdada dos tempos medievais, na qual os nobres, entre eles o rei, estavam no topo da hierarquia social, eram responsáveis pela proteção e justiça, além de terem a função de guerreiros e, posteriormente, também de administradores. Já os plebeus, eram os que trabalhavam em ofícios mecânicos, na terra, no comércio e em outras atividades. A nobreza poderia ser dividida, grosso modo, em nobreza de sangue – natural, passada por herança familiar – e a nobreza civil ou política – conquistada pela prestação de serviços relevantes ao Estado e ao rei. Os nobres de sangue, em Portugal, eram normalmente oriundos de famílias tradicionais, ainda do período de formação do Estado português durante a Baixa Idade Média. Eram considerados nobres de linhagem somente após três gerações da família, passando a ter direito a um brasão de armas. A concessão de títulos de nobreza no Império português foi um fenômeno dos tempos modernos, principalmente depois da expansão ultramarina, que agraciava, inicialmente, aqueles que faziam grandes esforços para a conquista de novas terras e mais poder para a monarquia, especialmente se para isso expunham-se a risco de morte e se o faziam com seu próprio patrimônio. Era um prêmio pela dedicação ao Estado e uma compensação financeira para os gastos, usado habilmente pelos reis portugueses para incentivar empresas ultramarinas, sem aumentar as despesas do Estado. A partir do século XVIII, a nobreza civil passou a exercer cargos de governança no reino e nos domínios ultramarinos, sem, entretanto, ferir o estatuto nobre, já que esta forma de trabalho não implicava em exercer força física. Essa ampliação nos quadros acabou por criar um problema de “distinção de qualidade” entre os nobres. O Estado reformou as leis que definiam as formas de tratamento de nobres e fidalgos nos anos de 1597, 1739 e 1759, com vistas a restabelecer o equilíbrio de importância, sobretudo da nobreza de sangue, e a se adaptar aos novos tempos. Dentro dos quadros de linhagem, criou-se o título de grandeza, que elevava a “grandes” os nascidos nobres de famílias mais antigas, tradicionais e ricas, e que gozavam de maiores privilégios e proximidade aos reis. No Brasil, a nobreza adquiriu contornos muito particulares: em primeiro lugar, porque, praticamente, não existiam nobres de nascimento – a maior parte era de altos funcionários da Coroa que conquistaram o título por emigrarem para conquistar, ocupar e produzir na colônia. Eram chamados “principais” ou “nobreza da terra”, descendentes dos primeiros conquistadores, pioneiros desbravadores das novas possessões da coroa portuguesa. Esta elite senhorial, além de recebedora de mercês e de terras (capitanias, sesmarias), também desempenhava funções administrativas, ocupando cargos que, pouco a pouco, foram sendo criados na estrutura administrativa colonial. A presença de índios e negros relativizou, da mesma forma, a pureza do sangue da nobreza brasileira, já que muitos herdeiros dos capitães-mores e governadores dos Estados tinham também descendência indígena e mestiça. A escravidão, ainda, adicionou novas variáveis, tornando qualquer um que não fosse escravo e de cor passível, merecedor de receber tratamento diferenciado e criou um imperativo particular da colônia: para almejar ser nobre era preciso, além das riquezas e propriedades habituais, ter escravos. Essa “nobreza da terra”, composta basicamente de indivíduos que se distinguiam não tanto pelo nascimento, mas por ocupar cargos importantes, ter escravos e posses, podiam ser senhores de terras, comerciantes de grosso trato de grandes capitais, desde que não exercessem pessoalmente trabalhos físicos.
[8] Segundo filho de d. Maria I e d. Pedro III, se tornou herdeiro da Coroa com a morte do seu irmão primogênito, d. José, em 1788. Em 1785, casou-se com a infanta Dona Carlota Joaquina, filha do herdeiro do trono espanhol, Carlos IV que, na época, tinha apenas dez anos de idade. Tiveram nove filhos, entre eles d. Pedro, futuro imperador do Brasil. Assumiu a regência do Reino em 1792, no impedimento da mãe que foi considerada incapaz. Um dos últimos representantes do absolutismo, d. João VI viveu num período tumultuado. Foi sob o governo do então príncipe regente que Portugal enfrentou sérios problemas com a França de Napoleão Bonaparte, sendo invadido pelos exércitos franceses em 1807. Como decorrência dessa invasão, a família real e a Corte lisboeta partiram para o Brasil em novembro daquele ano, aportando em Salvador em janeiro de 1808. Dentre as medidas tomadas por d. João em relação ao Brasil estão a abertura dos portos às nações amigas; liberação para criação de manufaturas; criação do Banco do Brasil; fundação da Real Biblioteca; criação de escolas e academias e uma série de outros estabelecimentos dedicados ao ensino e à pesquisa, representando um importante fomento para o cenário cultural e social brasileiro. Em 1816, com a morte de d. Maria I, tornou-se d. João VI, rei de Portugal, Brasil e Algarves. Em 1821, retornou com a Corte para Portugal, deixando seu filho d. Pedro como regente.
[9] Autoridade judiciária, tinha a função de zelar pelos órfãos de sua jurisdição e seus bens, inclusive registrando em livro próprio quantos órfãos havia e de que bens dispunham, além de verificar se os mesmos estavam sendo bem geridos. Aos juízes dos órfãos competia uma quantidade enorme de atribuições e atividades, até mais do que aos juízes ordinários e de fora. Entre as competências constam nomear e confirmar tutores e curadores, prover os órfãos de bens para garantir seu sustento, fazer inventários, avaliar os bens e realizar as partilhas, fazer vender imóveis e arrendar bens de raiz, cuidar para que os rendimentos seguissem para a educação do órfão, conceder cartas de emancipação e licenças de casamento. Eram responsáveis por assegurar com que todos os órfãos tivessem tutor até um mês depois do falecimento do pai ou da mãe, fossem familiares ou não, e por fiscalizar e verificar a idoneidade do tutor ou curador. Se sobre os tutores fosse constatada alguma irregularidade ou má conduta, o juiz deveria destituí-los e obrigá-los a restituir os bens dos órfãos, além de nomear um novo tutor. Era obrigação dos juízes fiscalizar e vigiar os valores que entravam e saíam do cofre dos órfãos e verificar o patrimônio dos tutores, além de fiscalizar o trabalho realizado pelo juiz anterior e denunciá-lo em caso de irregularidades, e arrecadar impostos e taxas para o Juízo. Possuía jurisdição sobre todas as ações cíveis que envolvessem os órfãos, fossem como autores ou réus, até a sua emancipação. Estruturalmente, o juízo dos órfãos era constituído pelo respectivo juiz, pelos escrivães, pelo tutor geral dos órfãos, pelo contador e pelos avaliadores e partidores. Ainda cabia a eles fiscalizar seus oficiais subordinados, escrivão, ajudante de escrivão, oficiais de registro, tesoureiro, contador, avaliador, partidor e porteiro do auditório – considerando que uma mesma pessoa poderia acumular mais de uma função – e prestar contas de tudo o que acontecia sob sua jurisdição ao Provedor, responsável, por sua vez, por fiscalizar as atividades do juiz dos órfãos.
[10] O provedor era imbuído de especiais funções quanto à vigilância e observância dos estatutos gerais e públicos de uma instituição, à obediência aos decretos, alvarás, avisos e resoluções. No Brasil o cargo foi criado em 1548, por ocasião da instalação do governo-geral, tendo por objetivo cuidar dos assuntos relativos à administração fazendária. Existiram várias categorias de provedores, todos subordinados ao provedor-mor (mais alta instância administrativa, responsável pela arrecadação, contabilidade, fiscalização e convocação dos oficiais da Fazenda) e que atuaram em instâncias diferenciadas, entre as quais se podem mencionar a Alfândega, a Justiça, a Casa da Moeda, as Minas, Defuntos e Ausentes, entre outras. Nomeados pelo rei ou pelo governador-geral, os provedores eram responsáveis por acompanhar e administrar as rendas e direitos régios arrecadados, fiscalizar e registrar a movimentação comercial, cobrar os direitos, punir as irregularidades cometidas pelos oficiais de Fazenda, entre outras funções. Prestavam contas ao provedor-mor, inicialmente, e depois ao Conselho da Fazenda.
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