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Sala de aula

Escrito por cotin | Publicado: Sexta, 23 de Fevereiro de 2018, 14h15 | Última atualização em Sexta, 23 de Fevereiro de 2018, 14h15

Instituição Vacínica

Ofício de João da Silva Moreira Payzinho ao prelado diocesano arcebispo Primaz, no qual consta a ordem de vacinação a todos que não foram ainda acometidos da doença das bexigas. Informa sobre a constituição por parte da Academia Real das Ciências de Lisboa de uma instituição vacínica, sendo seus membros promotores e facilitadores da vacinação gratuita. Há uma recomendação do príncipe regente ao arcebispo para que este estimule a vacinação pelo exemplo, com a vacinação voluntária de pessoas ilustres, e não só pelo puro aconselhamento. Ordena também ao arcebispo que repasse uma ordem aos párocos para citarem a vacinação em algumas missas de domingo.



Conjunto documental: Secretaria de Estado do Ministério do Reino
Notação: caixa 633, pct. 03, pacotilha 1, envelope 1, cópia 6, 3°doc.
Datas-limite: 1812-1813
Título do fundo: Negócios de Portugal
Código do fundo: 59
Argumento de pesquisa: Academia Real das Ciências de Lisboa
Data do documento: 19 de junho de 1813
Local: Lisboa
Folhas: -

 

Para o Arcebispo Primaz

Excelentíssimo e Reverendíssimo Senhor

Sendo a vacina[1] reconhecida por todas as nações civilizadas como preservativo inocente da funesta epidemia das bexigas[2], que sem ele poucos deixavam de ter e muitos morriam, e já felizmente muito experimentado neste reino, até com o Paternal exemplo que deu o Príncipe Regente[3] Nosso Senhor, fazendo vacinar seus augustos filhos[4]; são obrigados todos os que não têm tido bexigas a vacinarem-se, e os chefes de famílias a fazerem vacinar nas mesmas circunstâncias a todas as pessoas que deles dependerem. Para espertar esta obrigação e facilitar o uso geral do mesmo preservativo de que tanto bem resulta à humanidade e ao Estado, a Academia Real das Ciências[5] formou a Instituição Vacínica[6], composta de alguns de seus sócios facultativos, os quais muito tem trabalhado por si e seus correspondentes a promover e facilitar o dito uso geral, vacinando de graça todas as pessoas que se lhe apresentam. Como apesar de tantos desvelos e notórias utilidades, ainda há bastante negligência ao cumprimento da dita obrigação por falta de conhecimento e persuasão: Sua Alteza Real manda remeter a Vossa Excelência a alguns exemplares das instruções sobre o modo de vacinar, afim de que V. Ex.a possa divulgar estes necessários conhecimentos, como melhor lhe parecer. E é servido recomendar a V. Ex.a. 1º. Que V. Ex.a. promova a vacinação por todos os meios possíveis, especialmente pelo exemplo, sempre mais poderoso, que o conselho, procurando não só fazer vacinar todas as pessoas de sua família, que não tiverem tido bexigas, os empregados e alunos dos seminários[7], e outras corporações, que estiverem de baixo da sua inspeção, mas também persuadir as pessoas principais a que imitem tão louvável procedimento, pois a prática deste saudável invento depende inteiramente da opinião pública, para se introduzir em todas as famílias e classes da sociedade. 2º. Que V. Ex.a. ordene aos párocos[8], seus súditos, que não cessem de persuadir aos fregueses[9] por todos os modos, especialmente na citação da missa em alguns domingos as utilidades da vacinação, exortando a que se pratique por todos que dela necessitarem. Sua Alteza Real confia nas virtudes de V. Ex.a., que concorrerá cordialmente para uma obra tão meritória e de tanto interesse para o real serviço e bem da nação=Deus guarde a V. Ex.a. Palácio do Governo em 19 de junho de 1813 =João Antonio Salter de Mendonça[10]=

Na mesma conformidade e data se expediram avisos a todos os prelados diocesanos do reino.

Está conforme

João da Silva Moreira Payzinho

 

[1] VACINA: o nome vacina advém de vaccinia, agente infeccioso da varíola bovina que, quando inoculado no organismo humano, assegura imunidade à doença, considerada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como a mais devastadora da história. A vacina antivariólica data de 1749, quando era conhecida também como “vacina jenneriana” em razão do nome de seu inventor, o inglês Edward Jenner (1749-1823). Observando os ordenhadores de animais, Jenner constatou que estes adquiriam resistência à varíola após o contato com animais acometidos por cow-pox (pústula da vaca). O método então empregado baseava-se na injeção da pústula da vaca em pessoas sadias, o que causava nestes, erupções próximas às causadas pela varíola. A partir dessas erupções, extraia-se a “linfa” ou “pus variólico”, moendo a crosta da ferida até transformá-la em pó, que era inoculado em outras pessoas, numa cadeia sucessiva de imunização, denominada vacinação “braço a braço”. Tal técnica veio a substituir a antiga prática de “variolização” que consistia na inoculação de formas benignas da doença com objetivo de imunização, levando em muitos casos o indivíduo à morte. A doença foi trazida para o Brasil tanto por portugueses quanto por africanos e a vacina jenneriana foi introduzida em 1804 pelo Marquês de Barbacena. Foram enviados a Lisboa, um médico, a fim de aprender a técnica, e alguns escravos que foram vacinados e passaram a vacina para outras pessoas ao regressarem ao Brasil. Da Bahia, a técnica se estendeu ao Rio de Janeiro, tornando-se uma prática. No entanto, a vacina humanizada foi criticada porque como atingia a corrente sanguínea, transmitia também outras doenças e perdia sua potencialidade. O desenvolvimento da vacina animal, extraída das pústulas de vitelos sadios inoculados com o vírus vacínico, aconteceu no Brasil em 1887 com a criação do Instituto Vacínico Municipal, na rua do Catete, no Rio de Janeiro, que distribuía para as outras províncias. Logo depois, foram criados institutos em São Paulo, Bahia, Ceará, Pará e Pernambuco, diminuindo muito os problemas relacionados as doenças contagiosas. Antes disso, as lâminas e tubos capilares com o pus vacínico eram enviados ao Brasil pela Inglaterra. Porém isso não acontecia todos os meses como deveria e as vacinas mostraram-se enfraquecidas após a quarta ou quinta inoculação, produzindo vacinas nulas. A resistência à vacinação foi uma constante no século XIX, levando algumas câmaras municipais a decretarem a obrigatoriedade desta em épocas de epidemia. A população associava a inoculação à transmissão de doenças como tuberculose, sífilis, erisipela e temia que a vacina animal transmitisse as características e doenças do animal para o homem.

[2] BEXIGA(S): doença infectocontagiosa, causada por vírus, também conhecida como varíola. A varíola não tem cura e foi uma das doenças mais devastadora ao longo da história, até sua erradicação no século XX. No período colonial, as epidemias da doença foram um dos principais fatores de dizimação da população indígena que creditava o contágio à água do batismo usada pelos padres jesuítas. O primeiro grande surto que se tem notícia ocorreu na Bahia em 1562 e 1563, matando milhares de índios Tupinambá e dizimando aldeias inteiras. Além da epidemia que se alastrou entre as décadas de 60 e 80 do século XVI, outros surtos epidêmicos ocorreram no Rio de Janeiro já no século XVII, sendo o mais notável o de 1655 que atingiu, também, Bahia e Pernambuco. Associa-se o desenvolvimento da doença no Brasil ao tráfico atlântico de escravos oriundos da África. Em 1798, realizou-se no Rio de Janeiro a primeira vacinação contra a doença no país, ainda com o método da inoculação do pus da varíola. Somente em 1811, com a criação da Instituição Vacínica, é adotada a vacina jenneriana, com a linfa vacínica, extraída do úbere das vacas. A instituição criada no Rio de Janeiro pelo príncipe regente d. João, como resultado da preocupação com o alastramento da enfermidade, foi entregue aos cuidados e supervisão do intendente-geral da Polícia e do físico-mor do Reino e tinha como alvo principal a população negra cativa. Os escravos vacinados eram mais valorizados para a venda, uma vez que esta era uma doença responsável por grande parte das mortes entre negros. O século XIX também assistiu a grandes epidemias de varíola, sendo notáveis as ocorridas no Ceará, em fins da década de 70, e na cidade do Rio de Janeiro em 1887, quando a doença era responsável por 47% dos óbitos na cidade.

[3] JOÃO VI, D. (1767-1826): segundo filho de d. Maria I e d. Pedro III, se tornou herdeiro da Coroa com a morte do seu irmão primogênito, d. José, em 1788. Em 1785, casou-se com a infanta Dona Carlota Joaquina, filha do herdeiro do trono espanhol, Carlos IV que, na época, tinha apenas dez anos de idade. Tiveram nove filhos, entre eles d. Pedro, futuro imperador do Brasil. Assumiu a regência do Reino em 1792, no impedimento da mãe que foi considerada incapaz. Um dos últimos representantes do absolutismo, d. João VI viveu num período tumultuado. Foi sob o governo do então príncipe regente que Portugal enfrentou sérios problemas com a França de Napoleão Bonaparte, sendo invadido pelos exércitos franceses em 1807. Como decorrência dessa invasão, a família real e a Corte lisboeta partiram para o Brasil em novembro daquele ano, aportando em Salvador em janeiro de 1808. Dentre as medidas tomadas por d. João em relação ao Brasil estão a abertura dos portos às nações amigas; liberação para criação de manufaturas; criação do Banco do Brasil; fundação da Real Biblioteca; criação de escolas e academias e uma série de outros estabelecimentos dedicados ao ensino e à pesquisa, representando um importante fomento para o cenário cultural e social brasileiro. Em 1816, com a morte de d. Maria I, tornou-se d. João VI, rei de Portugal, Brasil e Algarves. Em 1821, retornou com a Corte para Portugal, deixando seu filho d. Pedro como regente.

[4] AUGUSTOS FILHOS: refere-se à descendência de d. João VI que, em 1785, casou-se com d. Carlota Joaquina de Bourbon (1775-1830), princesa da Espanha, e desse matrimônio nasceram nove filhos. D. Maria Teresa (1793-1874), princesa de Espanha por ter casado, no Rio de Janeiro, com o príncipe espanhol d. Pedro Carlos de Bourbon e Bragança, seu primo, que faleceu em 1813. Casou-se novamente, desta vez com o infante d. Carlos Maria Isidoro, também príncipe da Espanha, seu tio e viúvo de sua irmã d. Maria Francisca (1800-1834). D. Francisco António Pio de Bragança (1795-1801), primeiro filho varão de d. João, recebeu o título de príncipe da Beira e faleceu ainda criança. D. Maria Isabel Francisca de Bragança (1797-1818), rainha de Espanha pelo seu casamento com Fernando VII, rei da Espanha e seu tio, conhecida amante das artes, influenciou a criação do Museu do Prado, em Madrid, um ano após a sua morte. Na história brasileira destaca-se d. Pedro IV (1798-1834), herdeiro da Coroa portuguesa após a morte do primogênito d. Francisco Antônio, tendo recebido o título de príncipe real no mesmo ano da sagração de d. João como rei de Portugal em 1816. Com o retorno da família real a Portugal, em 1821, d. Pedro tornou-se príncipe regente do Brasil. Os planos políticos que as cortes de Lisboa destinavam ao Brasil levaram d. Pedro a romper definitivamente com Portugal, proclamando a independência do Brasil em setembro de 1822, sendo sagrado e coroado imperador e defensor perpétuo do Brasil (1822-1831). D. Miguel I (1802-1866), encabeçando o partido tradicionalista, foi promotor ou executor dos movimentos da Vila Francada, em 1823, e da Abrilada, em 1824, de natureza antiliberal, dirigidos contra o rei d. João VI. O primeiro pôs termo ao funcionamento das cortes liberais, à vigência da Constituição de 1822 e elevou d. Miguel a comandante-chefe do exército português. Quanto à Abrilada, o infante conseguiu prender altos funcionários e o próprio Rei, mas as intervenções dos embaixadores francês e inglês decretaram o malogro do golpe de Estado. Exilado por ordem de seu pai, d. Miguel deixou o país em 13 de maio de 1824, retornando ao primeiro plano da política portuguesa em 1826 com a morte de d. João VI. Com efeito, o herdeiro do trono português era d. Pedro IV, então Pedro I, imperador do Brasil, que outorga a carta constitucional. Em 1831 ele abdica em favor de sua filha d. Maria da Glória de apenas sete anos que, de acordo com o arranjo dinástico e político então combinado, casaria com o tio d. Miguel, garantindo-lhe a posição de regente durante a minoridade da rainha. Em julho de 1828 d. Miguel jurou perante os três Estados e em novembro foi aclamado rei, apesar da oposição liberal espalhada pelo país. Este reinado caracterizou-se pela incerteza política e por uma guerra civil (1832-1834), dirimida a favor dos liberais e contra d. Miguel que terminou por regressar ao exílio em primeiro de junho de 1834. Entre 1826 e 1828, d. Isabel Maria (1801-1876), ocupa o lugar de regente de Portugal, na impossibilidade da rainha d. Carlota Joaquina, exilada em Queluz, dos irmãos Pedro IV, e d. Miguel (que estava em Viena)e da inconveniência das irmãs mais velhas, casadas com príncipes espanhóis, em assumir o trono português. D. João VI teve ainda duas outras filhas: d. Maria da Assunção (1805-1835), favorável ao irmão d. Miguel, morreu solteira sem deixar herdeiros e d. Ana de Jesus Maria (1806-1857), filha caçula, casada com d. Nuno de Mendonça, o 2.º marquês de Loulé.

[5] ACADEMIA REAL DAS CIÊNCIAS DE LISBOA: fundada em 24 de dezembro de 1779, no início do reinado de d. Maria I, pelo duque de Lafões e pelo abade Correia da Serra. Embora consagrado como “viradeira” em razão de um suposto revisionismo em relação ao reformismo pombalino, o reinado mariano ainda é marcado pela aliança entre as ideias iluministas, os princípios da fisiocracia e o mercantilismo que caracterizou o período anterior. A Academia Real configura-se como espaço privilegiado para a elaboração de projetos e memórias vinculados a um pensamento econômico no qual a ênfase nas “Artes e na Agricultura” como saída para a crise parece levar a uma adesão incondicional à fisiocracia. No entanto, como adverte o historiador Fernando Novais no estudo Portugal e Brasil na crise do Antigo Sistema Colonial, trata-se de um ecletismo no qual "o pragmatismo cientificista lastreava o mercantilismo". Essa formulação se manifestou em uma prática científica a serviço do Estado na qual se identifica o primado da experiência sobre os sistemas, a defesa de um saber utilitário, a aplicação do conhecimento na solução de problemas práticos relacionados à economia, à cultura e à sociedade portuguesas. Tais premissas apontam para o papel que a instituição cumpriria como instrumento do Estado português no redirecionamento de sua política colonial e na recuperação da economia lusa no último quartel do século XVIII. Congregando homens da ciência, naturalistas, literatos e outros intelectuais portugueses e estrangeiros, a Academia articulava o Reino aos círculos europeus, desempenhando papel fundamental na ciência, na medicina, na economia e na literatura em Portugal. Esteve à frente dos grandes debates nacionais como as reformas na educação pública, na padronização dos pesos e medidas, culminando na adoção do sistema métrico francês e na institucionalização da vacinação através da Instituição Vacínica. Espaço de diálogo entre os ilustrados luso-brasileiros a Academia privilegiava o conhecimento científico voltado para a utilização racional da natureza a fim de atingir o progresso material, principalmente através das colônias, o que a levou a patrocinar viagens e expedições filosóficas às possessões portuguesas com a finalidade de conhecer o território, demarcar limites e realizar um “inventário” da natureza do Novo Mundo, enviando remessas da fauna e flora local para catalogação nos museus de história natural da Europa.

[6] INSTITUIÇÃO VACÍNICA: instituição criada em 4 de abril de 1811, pelo príncipe regente d. João, que tinha por finalidade disseminar e ampliar a vacinação contra a varíola – doença também conhecida como bexiga. Este órgão contava com um inspetor e três vacinadores, que eram cirurgiões. A vacinação ocorria com data e local marcados, todas as quintas-feiras e domingos na igreja de N. S. do Rosário no Rio de Janeiro. O público-alvo era formado principalmente por escravos, incluindo os que estavam à venda. A vacina contra a varíola passou a ser uma exigência para que os escravos aportados no Brasil fossem entregues a seus respectivos donos, exigindo-se para tanto um certificado de vacinação. A prática da vacinação contra a varíola não era exclusividade desta instituição, constando anúncios de médicos particulares na Gazeta do Rio de Janeiro, oferecendo-se para vacinar a população gratuitamente. Em Portugal, a Instituição Vacínica da Academia Real das Ciências de Lisboa foi criada em 1812, também com objetivo de promover a vacinação contra a varíola. O médico Bernardino Antônio Gomes, membro da academia, desempenhou papel determinante na fundação e organização da instituição que promovia a vacinação baseada no método jenneriano. Em menos de 10 anos de sua fundação, mais de 90.000 crianças em Lisboa foram vacinadas.

[7] SEMINÁRIO: estabelecimento destinado à educação e preparação dos homens que apresentassem vocação para o sacerdócio, cuja direção espiritual e temporal cabia ao bispo. A partir do Concílio de Trento (1545-1563), tornou-se obrigatória, em cada diocese, a existência de um seminário ou colégio voltado para a educação de futuros sacerdotes, levando-se em conta a disponibilidade e a necessidade de cada bispado. Em Portugal, somente em fins do século XVI, tem início uma expressiva fundação de seminários. Apesar dos breves papais reclamando das dioceses omissas, chama a atenção as datas tardias de fundação de seminários em importantes áreas episcopais de Portugal como Coimbra (1748), Bragança (1766), Algarve (1797), Lisboa (1741) e Porto, no início do século XIX. No Brasil, os jesuítas foram os principais responsáveis pela criação dos primeiros colégios e seminários, voltados para a educação dos colonos. Vários seminários, em diferentes localidades, foram criados como o de Aquirás no Ceará, em 1730; o de Nossa Senhora da Boa Morte, em 1748, primeira instituição educacional mineira aos cuidados do jesuíta José Nogueira; o de Caxias (1746) e de São Luís (1752) no Maranhão; São Paulo em 1746, entre outros. No entanto, com a reforma pombalina e a consequente expulsão dos jesuítas das colônias portuguesas, o aparelho educacional inaciano sofreria um desmantelamento sistemático. Instituíram-se aulas régias, que deveriam substituir as disciplinas antes oferecidas nos colégios jesuítas e novas instituições educacionais surgiram segundo parâmetros da reforma educacional portuguesa. Exemplo disso foi a fundação, em 1800, do seminário de Olinda, no prédio do antigo colégio jesuíta. Sua trajetória foi uma exceção no âmbito educacional da colônia pois, em lugar de preservar os estudos tipicamente voltados para teologia e filosofia, conferiu uma formação de caráter iluminista. Segundo Evaldo Cabral de Melo, o seminário de Olinda foi um dos centros propagadores das ideias burguesas durante a Revolução de 1817 e a Confederação de 1824.

[8] PÁROCO: membro do clero secular responsável por uma paróquia ou freguesia. O pároco, ou cura de almas, estabelecia contato mais direto com a população atuando como agente da Igreja no controle social, moral e religioso de seus fiéis, uma vez que, sob sua jurisdição, estavam as menores unidades espaciais eclesiásticas, as freguesias. Desempenhavam, além das funções religiosas como promover os cultos, pregações e sacramentos, outras relacionadas à regulação da convivência comunitária. Entre suas atribuições constava a elaboração de “róis de confessados”, chamados Liber Status animarum, lista dos fregueses maiores de sete anos que havia ou não cumprido o sacramento da confissão, obrigatório no período da quaresma. A partir destes róis, os párocos preenchiam censos anuais com informações acerca dos habitantes da freguesia.

[9] FREGUESES: os habitantes de uma freguesia. Em Portugal, as divisões administrativas das províncias estavam organizadas de acordo com a seguinte escala: cidades, vilas, freguesias e aldeias. Cada freguesia possuía uma situação jurídica própria, podendo ser de primeira, segunda ou terceira ordem. A freguesia deoprimeira ordem agrupava mais de 5.000 pessoas. As de segunda ordem, entre 800 e 5.000, e as de terceira ordem, menos de 800 pessoas. Em cada freguesia havia um regedor que era o representante da autoridade municipal e diretamente dependente do presidente da câmara municipal. O termo paróquia era utilizado como sinônimo de freguesia, na esfera eclesiástica, portanto fregueses, neste caso, são os membros de uma paróquia.

[10] MENDONÇA, JOÃO ANTÔNIO SALTER DE (1746-1825): nascido em Pernambuco, formou-se em Direito pela Universidade de Coimbra. Retorna ao Brasil, onde foi nomeado desembargador da Relação do Rio de Janeiro, por decreto de 17 de dezembro de 1772. Ainda nesta cidade, exerceu os cargos de ouvidor-geral do Cível, procurador da Coroa e da Fazenda Real, deputado da Fazenda, porteiro e guarda-mor da Alfândega. Em 1779, foi transferido para a Relação do Porto, ocupando os cargos de procurador fiscal e conservador da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro. Em 1789, é nomeado para desembargador da Casa da Suplicação de Lisboa. Em 18 de Fevereiro de 1799, assume o cargo de procurador da Coroa, que exerce concomitante com o de desembargador do Desembargo do Paço, a partir de 1802. Ao longo da vida, ocupa diversos outros cargos e funções públicas, entre eles, o de chanceler da Casa da Suplicação (1812), guarda-mor do Real Arquivo da Torre do Tombo (1813), presidente da Comissão do Exame dos Forais e Melhoramentos da Agricultura (1812) e presidente da Comissão da Nova Reforma de Pesos e Medidas (1812). Com a transferência da família Real para o Brasil, faz parte da regência nomeada por d. João VI, desempenhando as funções de secretário de Estado dos Negócios do Reino e da Fazenda, permanecendo nessas funções de 1807 até 1820. Também neste ano, recebe o título de 1° visconde de Azurara.

 

 


Sugestões para usos em sala de aula

Terceiro ciclo
- Eixo Temático: História das Relações Sociais, da Cultura e do Trabalho
- Subtema:  "As relações sociais e a natureza"
- Natureza e povos indígenas na visão dos europeus, exploração econômica de recursos naturais pelos colonizadores europeus, agricultura de subsistência e comercial, a conquista, a ocupação e a produção e a extração de riquezas naturais.

Quarto ciclo
- Eixo Temático: História das Representações e das Relações de Poder
- Subtema: Nações, povos, lutas, guerras e revoluções
- Administração política colonial, coroa portuguesa no Brasil

Loteria para a vacinação

Ofício enviado por José Bonifácio de Andrada e Silva, secretário da Academia Real das Ciências de Lisboa, solicitando a realização de uma nova loteria para patrocínio da vacinação pública promovida pela Instituição Vacínica da Academia Real. Menciona, ainda, os resultados da última loteria, cujo rendimento permitiu que a vacinação fosse realizada apenas em nove comarcas do reino de Portugal. Sugere que a nova loteria seja concedida em benefício das demais comarcas.

 

Conjunto documental: Secretaria de Estado do Ministério do Reino
Notação: caixa 703, pct.1
Data-limite: 1809-1818
Título do fundo: Negócios de Portugal
Código de fundo: 59
Argumento de pesquisa: Academia Real das Ciências de Lisboa
Data do documento: 21 de fevereiro de 1817
Local: Lisboa.
Folha(s):12

 

A Academia Real de Ciências[1] sempre animada do mesmo espírito patriótico a favor da vacinação recorre segunda vez a soberana proteção de Vossa Majestade[2] pedindo vossa loteria[3], para a instituição vacínica[4] continuar na empresa de salvar, como já tem feito, a milhares de vidas aos vassalos[5] de Vossa Magestade.

A loteria, que V. Maj. concedeu no fim do ano de 1815 foi de cinco mil bilhetes, cujo produto distribuído com toda a economia apenas bastou para que a vacinação se estabelecesse em nove comarcas[6] segundo o plano, que V. Maj. se dignou aprovar agora julga a Academia dever representar muito conveniente, que este benefício se haja de estender gradualmente pelas demais comarcas do Reino de Portugal[7], e que para este bem chega a mais outras nove, se dobre o número dos bilhetes, favor que a academia espera de empreitar, porque ela só tem em vista a utilidade pública, que a mira dos paternais desvelos do seu Augusto Reinado, e o prazer do magnânimo coração de V. Mag. a vista do exposto V. Maj. ordenará o que for da sua vontade e agrado.

Secretaria d`Academia Real de Ciências em 21 de fevereiro de 1817

 

O Secretário da Academia, José Bonifácio de Andrada e Silva[8].

 

[1] ACADEMIA REAL DAS CIÊNCIAS DE LISBOA: fundada em 24 de dezembro de 1779, no início do reinado de d. Maria I, pelo duque de Lafões e pelo abade Correia da Serra. Embora consagrado como “viradeira” em razão de um suposto revisionismo em relação ao reformismo pombalino, o reinado mariano ainda é marcado pela aliança entre as ideias iluministas, os princípios da fisiocracia e o mercantilismo que caracterizou o período anterior. A Academia Real configura-se como espaço privilegiado para a elaboração de projetos e memórias vinculados a um pensamento econômico no qual a ênfase nas “Artes e na Agricultura” como saída para a crise parece levar a uma adesão incondicional à fisiocracia. No entanto, como adverte o historiador Fernando Novais no estudo Portugal e Brasil na crise do Antigo Sistema Colonial, trata-se de um ecletismo no qual "o pragmatismo cientificista lastreava o mercantilismo". Essa formulação se manifestou em uma prática científica a serviço do Estado na qual se identifica o primado da experiência sobre os sistemas, a defesa de um saber utilitário, a aplicação do conhecimento na solução de problemas práticos relacionados à economia, à cultura e à sociedade portuguesas. Tais premissas apontam para o papel que a instituição cumpriria como instrumento do Estado português no redirecionamento de sua política colonial e na recuperação da economia lusa no último quartel do século XVIII. Congregando homens da ciência, naturalistas, literatos e outros intelectuais portugueses e estrangeiros, a Academia articulava o Reino aos círculos europeus, desempenhando papel fundamental na ciência, na medicina, na economia e na literatura em Portugal. Esteve à frente dos grandes debates nacionais como as reformas na educação pública, na padronização dos pesos e medidas, culminando na adoção do sistema métrico francês e na institucionalização da vacinação através da Instituição Vacínica. Espaço de diálogo entre os ilustrados luso-brasileiros a Academia privilegiava o conhecimento científico voltado para a utilização racional da natureza a fim de atingir o progresso material, principalmente através das colônias, o que a levou a patrocinar viagens e expedições filosóficas às possessões portuguesas com a finalidade de conhecer o território, demarcar limites e realizar um “inventário” da natureza do Novo Mundo, enviando remessas da fauna e flora local para catalogação nos museus de história natural da Europa.

[2] JOÃO VI, D. (1767-1826): segundo filho de d. Maria I e d. Pedro III, se tornou herdeiro da Coroa com a morte do seu irmão primogênito, d. José, em 1788. Em 1785, casou-se com a infanta Dona Carlota Joaquina, filha do herdeiro do trono espanhol, Carlos IV que, na época, tinha apenas dez anos de idade. Tiveram nove filhos, entre eles d. Pedro, futuro imperador do Brasil. Assumiu a regência do Reino em 1792, no impedimento da mãe que foi considerada incapaz. Um dos últimos representantes do absolutismo, d. João VI viveu num período tumultuado. Foi sob o governo do então príncipe regente que Portugal enfrentou sérios problemas com a França de Napoleão Bonaparte, sendo invadido pelos exércitos franceses em 1807. Como decorrência dessa invasão, a família real e a Corte lisboeta partiram para o Brasil em novembro daquele ano, aportando em Salvador em janeiro de 1808. Dentre as medidas tomadas por d. João em relação ao Brasil estão a abertura dos portos às nações amigas; liberação para criação de manufaturas; criação do Banco do Brasil; fundação da Real Biblioteca; criação de escolas e academias e uma série de outros estabelecimentos dedicados ao ensino e à pesquisa, representando um importante fomento para o cenário cultural e social brasileiro. Em 1816, com a morte de d. Maria I, tornou-se d. João VI, rei de Portugal, Brasil e Algarves. Em 1821, retornou com a Corte para Portugal, deixando seu filho d. Pedro como regente.

[3] LOTERIA: usualmente conhecida como jogo de azar, por meio de bilhetes numerados ou frações destes com o fim de se obterem prêmios pecuniários que são indicados por sorteios. Sua criação em Portugal data do final do século XVII, quando já estava instituída em alguns países da Europa. As loterias foram criadas com o objetivo de arrecadar receita para operações financeiras, principalmente visando reformar a moeda e fazer circular o dinheiro existente no Reino. D. Pedro II, rei de Portugal de 1683 a 1706, em carta régia datada de 4 de maio de 1688, criou a primeira loteria portuguesa, chamada loteria real. Em 1805, o príncipe regente d. João VI decreta a mudança de definição de loteria real para loteria nacional. Ao estado cabia a prerrogativa de autorizar a realização de loterias, em geral concedida a instituições beneficentes e científicas. Um dos destinos dos recursos obtidos com tais loterias foi a Academia Real das Ciências de Lisboa, instituição científica criada em 1779. O 1º duque de Lafões, seu sócio-fundador, foi o responsável por ser destinada à academia, por diversas vezes, parte das receitas das loterias, principalmente após 1799, quando o príncipe d. João VI arbitrou à instituição 4.800.000 réis anualmente.

[4] INSTITUIÇÃO VACÍNICA: instituição criada em 4 de abril de 1811, pelo príncipe regente d. João, que tinha por finalidade disseminar e ampliar a vacinação contra a varíola – doença também conhecida como bexiga. Este órgão contava com um inspetor e três vacinadores, que eram cirurgiões. A vacinação ocorria com data e local marcados, todas as quintas-feiras e domingos na igreja de N. S. do Rosário no Rio de Janeiro. O público-alvo era formado principalmente por escravos, incluindo os que estavam à venda. A vacina contra a varíola passou a ser uma exigência para que os escravos aportados no Brasil fossem entregues a seus respectivos donos, exigindo-se para tanto um certificado de vacinação. A prática da vacinação contra a varíola não era exclusividade desta instituição, constando anúncios de médicos particulares na Gazeta do Rio de Janeiro, oferecendo-se para vacinar a população gratuitamente. Em Portugal, a Instituição Vacínica da Academia Real das Ciências de Lisboa foi criada em 1812, também com objetivo de promover a vacinação contra a varíola. O médico Bernardino Antônio Gomes, membro da academia, desempenhou papel determinante na fundação e organização da instituição que promovia a vacinação baseada no método jenneriano. Em menos de 10 anos de sua fundação, mais de 90.000 crianças em Lisboa foram vacinadas.

[5] VASSALO: súdito do rei, independentemente de sua localização no Império. Até o século XV, o título “vassalo” era empregado para designar homens fiéis ao rei, aqueles que o serviam na guerra, sendo, portanto, cavaleiros ou nobres de títulos superiores. Em troca do apoio e serviços realizados, recebiam tenças (pensões), dadas, inicialmente, a todos os vassalos e seus filhos varões. Na medida em que se pulverizaram as distribuições destes títulos, principalmente por razões de guerra (a conquista de Ceuta foi a mais significativa nesse processo), e que eles começaram a ser mais almejados, principalmente pelos plebeus e burgueses em busca de mercês e de aproximação com a realeza, o rei diminui a concessão dos títulos, e, mais importante, das tenças. A esta altura, as dificuldades financeiras da monarquia também empurraram para a suspensão da distribuição dos títulos e benefícios. O rei passa, então, a conceder mercês e vantagens individuais, e o termo vassalo se esvazia do antigo significado de título, passando a indicar homens do rei, súditos e habitantes do reino, de qualquer parte do Império.

[6] COMARCA: Termo que designa as unidades administrativas de Portugal. No início do século XVI, as comarcas portuguesas correspondiam às atuais províncias ou regiões portuguesas de Entre-Douro-e-Minho, Trás-os-Montes, Beira, Estremadura, Alentejo e Algarve. A partir de 1532, inicia-se a subdivisão dessas unidades em novas comarcas, processo que perdura até meados do século XVI, totalizando 27 unidades administrativas. A criação de novas comarcas viria a garantir um maior controle fiscal e administrativo do território, através da multiplicação da figura dos corregedores. Cabia ao corregedor, enquanto magistrado representante da coroa, a fiscalização do exercício do poder local tanto na esfera administrativa, quanto na jurídica. Estavam sob sua vigilância juizes, vereadores, procuradores dos concelhos, escrivães, tabeliães, alcaides, bispos, arcebispos, etc. A nova delimitação territorial levou em conta as características geográficas do território, com o respeito pelas bacias hidrográficas e o uso de cadeias montanhosas como fronteira entre diferentes comarcas.

[7] PORTUGAL: país situado na Península Ibérica, localizada na Europa meridional, cuja capital é Lisboa. Sua designação originou-se de uma unidade administrativa do reino de Leão, o condado Portucalense, cujo nome foi herança da povoação romana que ali existiu, chamada Portucale (atual cidade do Porto). Compreendido entre o Minho e o Tejo, o Condado Portucalense, sob o governo de d. Afonso Henriques, deu início às lutas contra os mouros (vindos da África no século VIII), das quais resultou a fundação do reino de Portugal no século XIII. Tornou-se o primeiro reino a constituir-se como Estado Nacional após a Revolução de Avis em 1385. A centralização política foi um dos fatores que levaram o reino a ser o precursor da expansão marítima e comercial europeia, constituindo vasto império com possessões na África, nas Américas e nas Índias ao longo dos séculos XV e XVI. Os séculos seguintes à expansão foram interpretados na perspectiva da Ilustração e por parte da historiografia contemporânea como uma lacuna na trajetória portuguesa, um desvio em relação ao impulso das navegações e dos Descobrimentos e que sobretudo distanciou os portugueses da Revolução Científica. Era o “reino cadaveroso”, dominado pelos jesuítas, pela censura às ideias científicas, pelo ensino da Escolástica. Para outros autores tratou-se de uma outra via alternativa, a via ibérica, sem a conotação do “atraso”. O século XVII é o da união das coroas de Portugal e Espanha, período que iniciado ainda em 1580 se estendeu até 1640 com a restauração e a subida ao trono de d. João IV. Do ponto de vista da entrada de novas ideias no reino deve-se ver que independente da perspectiva adotada há um processo, uma transição, que conta a partir da segunda metade do XVII com a influência dos chamados “estrangeirados” sob d. João V, alterando em parte o cenário intelectual e mesmo institucional luso. Um momento chave para a história portuguesa é inaugurado com a subida ao trono de d. José I e o início do programa de reformas encetado por seu ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, o marquês de Pombal. Com consequências reconhecidas a longo prazo, no reino e em seus domínios, como se verá na América portuguesa, é importante admitir os limites dessa política, como adverte Francisco Falcon para quem “por mais importantes que tenham sido, e isso ir-se-ia tornar mais claro a médio e longo prazo, as reformas de todos os tipos que formam um conjunto dessa prática ilustrada não queriam de fato demolir ou subverter o edifício social” (A época pombalina, 1991, p. 489). O reinado de d. Maria I a despeito de ser conhecido como “a viradeira”, pelo recrudescimento do poder religioso e repressivo compreende a fundação da Academia Real de Ciências de Lisboa, o empreendimento das viagens filosóficas no reino e seus domínios, e assiste a fermentação de projetos sediciosos no Brasil, além da formação de um projeto luso-brasileiro que seria conduzido por personagens como o conde de Linhares, d. Rodrigo de Souza Coutinho. O impacto das ideias iluministas no mundo luso-brasileiro reverberava ainda os acontecimentos políticos na Europa, sobretudo na França que alarmava as monarquias do continente com as notícias da Revolução e suas etapas. Ante a ameaça de invasão francesa, decorrente das guerras napoleônicas e face à sua posição de fragilidade no continente, em que se reconhece sua subordinação à Grã-Bretanha, a família real transfere-se com a Corte para o Brasil, estabelecendo a sede do império ultramarino português na cidade do Rio de Janeiro a partir de 1808. A década de 1820 tem início com o questionamento da monarquia absolutista em Portugal, num movimento de caráter liberal que ficou conhecido como Revolução do Porto. A exemplo do que ocorrera a outras monarquias europeias, as Cortes portuguesas reunidas propõem a limitação do poder real, mediante uma constituição. Diante da ameaça ao trono, d. João VI retorna a Portugal, jurando a Constituição em fevereiro de 1821, deixando seu filho Pedro como príncipe regente do Brasil. Em 7 de setembro de 1822, d. Pedro proclamou a independência do Brasil, perdendo Portugal, sua mais importante colônia.

[8] SILVA, JOSÉ BONIFÁCIO DE ANDRADA E (1763-1838): intelectual ilustrado, naturalista e político que exerceu grande influência no processo de independência do Brasil. Nasceu em Santos em 1763, proveniente de família rica e pai funcionário da administração colonial. Assim como os demais integrantes da “geração de 1790” formou-se na Universidade de Coimbra, nos cursos de filosofia e direito. Como sócio da Academia Real de Ciências de Lisboa, viajou pela Europa estudando química e mineralogia. Em Portugal, ocupou as funções de Intendente Geral das Minas e Metais do Reino, professor de metalurgia em Coimbra e diretor do Real Laboratório da Casa da Moeda. De volta a São Paulo em 1819, viajou pela província fazendo estudos mineralógicos e em seguida, por ocasião da Revolução do Porto, foi eleito membro da Junta Governativa de São Paulo. Era adepto da ideia de um Império luso-brasileiro, sem que o Brasil perdesse a autonomia já conquistada. Porém, as pressões das Cortes de Lisboa o fizeram mudar de estratégia e defender, então, a emancipação da colônia. Conhecido por suas articulações políticas na construção do novo império idealizou a aclamação do imperador, além de trabalhar na adesão das províncias que ainda se mantinham fiéis a Lisboa e no reconhecimento da independência junto a Inglaterra. Quando d. Pedro I, em 1823, dissolveu a assembleia constituinte para a qual foi eleito com seus irmãos Antônio Carlos e Martim Francisco, Bonifácio rompeu relações com o imperador e passou a criticar seu autoritarismo e aproximação com os grupos portugueses, o que o levou a ser deportado para a França. A reaproximação entre ambos aconteceu em 1829, quando voltou ao Brasil. Depois se tornou tutor de d. Pedro II por ocasião da abdicação. Foi destituído desta função e preso em sua casa em Paquetá por seus adversários, acusado de apoiar a restauração de d. Pedro. Mesmo com a absolvição, em 1835, permaneceu nessa casa até sua morte em 1838. Inspirado pelo ideário das Luzes [Iluminismo], Bonifácio mostrou-se preocupado com as populações indígenas, contrário ao trabalho escravo e favorável à educação como meio de transformação da sociedade. Dentre suas principais contribuições à Assembleia de 1823 constam o fim da escravidão e a civilização dos índios, propondo a distribuição de terras gratuitas a imigrantes pobres, a negros forros, a mulatos e índios domesticados. Por outro lado, também assumia um ideário conservador ao defender o sistema monárquico centralizado e o princípio de um Estado aliado a uma elite para a condução do país ao progresso.

 

 

Sugestões para usos em sala de aula

Terceiro ciclo

- Eixo Temático: História das Relações Sociais, da Cultura e do Trabalho
- Subtema:  "As relações sociais e a natureza"
- Natureza e povos indígenas na visão dos europeus, exploração econômica de recursos naturais pelos colonizadores europeus, agricultura de subsistência e comercial, a conquista, a ocupação e a produção e a extração de riquezas naturais.

Quarto ciclo

Eixo Temático: História das Representações e das Relações de Poder

- Subtema: Nações, povos, lutas, guerras e revoluções
- Administração política colonial, coroa portuguesa no Brasil

Peso e Medidas

Carta enviada ao rei d. João VI pelo marquês de Borba, Ricardo Raimundo Nogueira, conde de Peniche e João Antonio Salter de Mendonça, tratando do aviso de 12 de setembro de 1814, referente à publicação do plano de pesos e medidas para Portugal, adaptado junto aos sócios da Academia Real das Ciências de Lisboa, com o objetivo de estabelecer um padrão de pesos e medidas e da necessidade de se publicar uma lei que assegurasse a execução da reforma.

 

Conjunto documental: Secretaria de Estado do Ministério do Reino
Notação: caixa 703, pct. 02, conta dos Governadores 548, doc. nº1
Datas-limite: 1809-1818
Titulo do fundo: Negócios de Portugal
Código do fundo: 59
Argumento de pesquisa: Academia Real das Ciências de Lisboa
Data do documento: 16 de agosto de 1818
Local: Lisboa
Folhas: 2 a 5v

 

Senhor,

Vossa Majestade[1] foi servido por aviso de 12 de setembro de 1814 Nº 1º, conformando-se com o parecer do governo e da Mesa do Desembargo do Paço[2] na resolução da consulta, que baixou com o dito aviso sobre a reforma dos pesos e medidas[3] provar o plano proposto pela comissão do exame dos forais[4] adotado pela pluralidade dos sócios da Academia Real das Ciências[5], escolhidos para o discutir, por conter os requisitos precisos para remover os inconvenientes da diversidade dos pesos e medidas, com um método fácil, exato e muito acomodado à inteligência de todos; e desejando que os benefícios desta útil reforma se estendesse ao reino do Brasil, e a todos os seus domínios, ordenou que o governo encarregasse este negócio a pessoas da sua confiança, que mandariam pedir as clarezas que fossem precisas para esse efeito. Em execução da mesma real ordem, logo o governo aumentou a comissão com outros sócios beneméritos, para concluir este importantíssimo negócio. A comissão com muito zelo do serviço de Vossa Majestade, sem perda de tempo procurou desempenhar este novo encargo, não só fazendo fabricar os novos padrões, mas também formando uns apontamentos para a regularidade, firmeza e melhor execução do plano adotado. Apresentou estes e duas caixas de padrões semelhantes aos que se deviam distribuir aqui sem necessidade de mais clarezas, visto que estas somente são necessárias para as combinações dos padrões existentes com os novos, a fim de se fazerem as tabelas de redução. Tudo levamos à augusta presença de Vossa Majestade na conta Nº. 388 juntamente com o exame, a que tinha precedido a comissão sobre as reflexões remetidas de Paris contra o plano adotado. E Vossa Majestade honrando a comissão, foi servido declarar no aviso de 12 de julho de 1816 Nº. 2º, que ficava bem inteirado do grande zelo e eficácia que ela tinha empregado neste trabalho, cujos resultados vira nos ditos apontamentos e no sistema completo dos padrões remetidos nas ditas duas caixas, para se poder executar neste reino tão útil reforma segundos os seus reais desejos pronunciados no mesmo aviso de 12 de setembro. Igualmente se dignou Vossa Majestade significar a grande satisfação que tivera, em que por aquele exame se reconhecessem já previstas e meditadas, quando se tratou da mencionada reforma, as ditas reflexões a favor do outro plano, que tinha sido excluído pela pluralidade com pleno conhecimento dos seus defeitos. A comissão deu ultimamente a conta Nº. 3º, em que representa a Vossa Majestade, que estão fabricados e aferidos os cinquenta padrões de bronze dos pesos e medidas, que são necessários para todas as câmaras de cabeças de comarcas[6] destes reinos; examinadas e aferidas todas as medidas das câmaras da Extremadura, a fim de fazerem as tabelas de redução, bastando a inspeção das ditas medidas, para se conhecer a desordem e perdição deste importantíssimo ramo econômico; e por consequência a necessidade da reforma ordenada por Vossa Majestade; pois não existe nas ditas câmaras padrão algum de bronze dos que lhe deu o senhor Rei Dom Sebastião[7]; sendo a maior parte dos que há de pão, barro, ou folha de Flandres[8], rotos, quebrados, e alterados, havendo câmara que não tem padrão algum, talvez pela invasão dos inimigos[9]; e suplica à Vossa Majestade a mercê[10] de mandar publicar a lei, de que unicamente depende a execução da mesma reforma, para bem dos povos, dos interesses da Real Fazenda[11], e das transações comerciais, que muito utilizam com as vantagens do sistema métrico[12], o qual geralmente se vai adotando. Sendo Vossa Majestade o primeiro soberano que o adotou e mandou seguir nos seus domínios.

O governo põe todo o referido na presença de Vossa Majestade; parecendo-lhe que a súplica da comissão é muito digna da real contemplação de Vossa Majestade que mandara o que for servido.

A muito alta e muito poderosa pessoa de Vossa Majestade, guarde Deus muitos anos, como desejamos e havemos mister. Lisboa, no Palácio do Governo, em 16 de agosto de 1818.

Marquês de Borba[13] 

Ricardo Raimundo Nogueira[14]

Conde de Peniche[15]

João Antonio Salter de Mendonça[16]

 

[1] JOÃO VI, D. (1767-1826): segundo filho de d. Maria I e d. Pedro III, se tornou herdeiro da Coroa com a morte do seu irmão primogênito, d. José, em 1788. Em 1785, casou-se com a infanta Dona Carlota Joaquina, filha do herdeiro do trono espanhol, Carlos IV que, na época, tinha apenas dez anos de idade. Tiveram nove filhos, entre eles d. Pedro, futuro imperador do Brasil. Assumiu a regência do Reino em 1792, no impedimento da mãe que foi considerada incapaz. Um dos últimos representantes do absolutismo, d. João VI viveu num período tumultuado. Foi sob o governo do então príncipe regente que Portugal enfrentou sérios problemas com a França de Napoleão Bonaparte, sendo invadido pelos exércitos franceses em 1807. Como decorrência dessa invasão, a família real e a Corte lisboeta partiram para o Brasil em novembro daquele ano, aportando em Salvador em janeiro de 1808. Dentre as medidas tomadas por d. João em relação ao Brasil estão a abertura dos portos às nações amigas; liberação para criação de manufaturas; criação do Banco do Brasil; fundação da Real Biblioteca; criação de escolas e academias e uma série de outros estabelecimentos dedicados ao ensino e à pesquisa, representando um importante fomento para o cenário cultural e social brasileiro. Em 1816, com a morte de d. Maria I, tornou-se d. João VI, rei de Portugal, Brasil e Algarves. Em 1821, retornou com a Corte para Portugal, deixando seu filho d. Pedro como regente.

[2] MESA DO DESEMBARGO DO PAÇO (LISBOA): também chamada de Tribunal do Desembargo do Paço, foi o mais alto órgão da administração central portuguesa até o século XIX, que regia o Reino, e não o Ultramar. Este tribunal, estabelecido no reinado de d. João II (1481-1495) mas somente efetivado no período de d. Manuel I (1495-1521), era o tribunal supremo da monarquia, responsável por questões relativas à justiça e à administração civil do reino no âmbito da Graça. Tornou-se autônomo em relação à Casa de Suplicação em 1521, recebendo novo regimento. Até o reinado de d. Sebastião I, suspenso em 1578, quem presidia o Tribunal era o próprio rei, o que passou a não ser mais obrigatório com uma mudança instituída durante os reinados Filipinos (1580-1640). Constituído por um corpo de magistrados, já então denominados desembargadores do Paço, recrutados principalmente entre os eclesiásticos, teólogos e juristas experientes, este órgão da administração central da coroa, possuía uma grande variedade de incumbências, tendo suas funções revistas e ampliadas por sucessivas alterações de regimento, dentre as quais compreendiam: a concessão de cartas de perdão e cartas de privilégio; concessão de perdões reais, suspensão de degredos; a dispensa de idade e de nobreza para servir nos cargos de governo; comutação de pena aos criminosos; restituição de fama e outras mercês semelhantes; a legitimação e emancipação de filhos; a concessão de licença para impressão de livros; deliberando, ainda, sobre o recrutamento e provimento de juízes e arbitrando conflitos entre os demais tribunais da Coroa; entre outras questões. A vinda da corte para o Brasil em 1808 acarretou a criação da Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens no Rio de Janeiro, por meio do alvará de 22 de abril daquele ano, que incorporou parte dos encargos da Mesa da Consciência e Ordens de Lisboa. No entanto, a Mesa do Desembargo do Paço do Reino continuou a existir, sendo extinta apenas em 1833, no âmbito da guerra civil entre liberais e absolutistas, suas atribuições passando para as Secretarias de Estado do Reino e dos Negócios Eclesiásticos e da Justiça.

[3] REFORMA DOS PESOS E MEDIDAS: com a unificação do território português surge a necessidade de padronização dos pesos e medidas no reino. Posteriormente, com a incorporação de novos territórios decorrente da expansão marítima e comercial, dos séculos XV e XVI, a preocupação com a uniformização dos pesos e medidas se estende a todo império ultramarino. A imprecisão das unidades de medidas usuais, que permitia fraudes, opunha-se à crescente importância de um sistema unificado e científico de pesos e medidas que facilitasse as transações comerciais, tanto no interior do império como entre as diferentes nações europeias. Apontando para uma tendência de uniformização dos pesos e medidas a nível mundial, em função do comércio e das trocas científicas, é adotado o “marco” em Portugal, medida de peso de uso corrente na Europa, por provisão, em outubro de 1488. Assim, observam-se diversas reformas e regramentos no sentido de estabelecer uma uniformização, e a partir do século XIX, a Academia Real das Ciências de Lisboa toma parte em algumas das comissões encarregadas das reformas. Ainda em 1812, é criada uma Comissão para o exame dos forais e melhoramentos da agricultura que, em conjunto com a Academia Real, propõe uma reforma baseada no modelo francês, mas que mantinha a terminologia portuguesa, de forma a atenuar a mudança. Finalmente, através de decreto de d. Maria II, em meados do século XIX, é implantado o sistema métrico decimal adotando a nomenclatura francesa. Até então, as unidades de medidas mais usadas em Portugal e, por conseguinte, no Brasil, eram: para comprimento, a légua (6.600 m), a braça (2,2 m), a vara (1,1 m) e o palmo (0,22 m); para peso, a arroba (≈15 kg), o marco (≈230 g), o arratel (≈460 g), a onça (28,691 g), o grão (50g) e a oitava (3,586 g). Já na pesagem do açúcar, utilizava-se o pão (63,4 Kg); o saco (75 Kg); o barril, a barrica e o tonel (120Kg); a caixa (300 Kg) e a tonelada (1000 Kg). Por fim, como medidas de volume, temos a cuia (1,1 l), a canada (2,662 l), o quartilho (0,665 l), o almude (31,944 l), o alqueire (36,4 l) e a pipa (485 l).

[4] COMISSÃO DO EXAME DOS FORAIS: criada em 1812, a Comissão para exame dos Forais e Melhoramentos da Agricultura, dirigida por João Salter de Mendonça, secretário de Estado dos Negócios do Reino e Fazenda, foi incumbida, entre outras atividades, de avaliar o estado dos pesos e medidas em Portugal e propor reformas. Em conjunto com a Academia Real das Ciências de Lisboa, a comissão propôs uma adaptação do sistema decimal francês, mantendo as nomenclaturas de pesos e medidas já conhecidas dos portugueses, já que em função da recente invasão francesa a Portugal seria inoportuno adotar integralmente o sistema métrico. O projeto da comissão recebe o aval do príncipe regente d. João e, em 1814, são fabricados novos padrões.

[5] ACADEMIA REAL DAS CIÊNCIAS DE LISBOA: fundada em 24 de dezembro de 1779, no início do reinado de d. Maria I, pelo duque de Lafões e pelo abade Correia da Serra. Embora consagrado como “viradeira” em razão de um suposto revisionismo em relação ao reformismo pombalino, o reinado mariano ainda é marcado pela aliança entre as ideias iluministas, os princípios da fisiocracia e o mercantilismo que caracterizou o período anterior. A Academia Real configura-se como espaço privilegiado para a elaboração de projetos e memórias vinculados a um pensamento econômico no qual a ênfase nas “Artes e na Agricultura” como saída para a crise parece levar a uma adesão incondicional à fisiocracia. No entanto, como adverte o historiador Fernando Novais no estudo Portugal e Brasil na crise do Antigo Sistema Colonial, trata-se de um ecletismo no qual "o pragmatismo cientificista lastreava o mercantilismo". Essa formulação se manifestou em uma prática científica a serviço do Estado na qual se identifica o primado da experiência sobre os sistemas, a defesa de um saber utilitário, a aplicação do conhecimento na solução de problemas práticos relacionados à economia, à cultura e à sociedade portuguesas. Tais premissas apontam para o papel que a instituição cumpriria como instrumento do Estado português no redirecionamento de sua política colonial e na recuperação da economia lusa no último quartel do século XVIII. Congregando homens da ciência, naturalistas, literatos e outros intelectuais portugueses e estrangeiros, a Academia articulava o Reino aos círculos europeus, desempenhando papel fundamental na ciência, na medicina, na economia e na literatura em Portugal. Esteve à frente dos grandes debates nacionais como as reformas na educação pública, na padronização dos pesos e medidas, culminando na adoção do sistema métrico francês e na institucionalização da vacinação através da Instituição Vacínica. Espaço de diálogo entre os ilustrados luso-brasileiros a Academia privilegiava o conhecimento científico voltado para a utilização racional da natureza a fim de atingir o progresso material, principalmente através das colônias, o que a levou a patrocinar viagens e expedições filosóficas às possessões portuguesas com a finalidade de conhecer o território, demarcar limites e realizar um “inventário” da natureza do Novo Mundo, enviando remessas da fauna e flora local para catalogação nos museus de história natural da Europa.

[6] COMARCA: termo que designa as unidades administrativas de Portugal. No início do século XVI, as comarcas portuguesas correspondiam às atuais províncias ou regiões portuguesas de Entre-Douro-e-Minho, Trás-os-Montes, Beira, Estremadura, Alentejo e Algarve. A partir de 1532, inicia-se a subdivisão dessas unidades em novas comarcas, processo que perdura até meados do século XVI, totalizando 27 unidades administrativas. A criação de novas comarcas viria a garantir um maior controle fiscal e administrativo do território, através da multiplicação da figura dos corregedores. Cabia ao corregedor, enquanto magistrado representante da coroa, a fiscalização do exercício do poder local tanto na esfera administrativa, quanto na jurídica. Estavam sob sua vigilância juizes, vereadores, procuradores dos concelhos, escrivães, tabeliães, alcaides, bispos, arcebispos, etc. A nova delimitação territorial levou em conta as características geográficas do território, com o respeito pelas bacias hidrográficas e o uso de cadeias montanhosas como fronteira entre diferentes comarcas.

[7] SEBASTIÃO, D. (1544-1578): décimo sexto rei de Portugal, era filho do príncipe d. João e de d. Joana de Áustria. Seu nascimento foi festejado pela Coroa que temia não conseguir um sucessor para o trono, recebendo o príncipe, por este motivo, o cognome de O desejado. Substituiu seu avô, d. João III, assumindo o trono português em 1568. De saúde precária, d. Sebastião teve uma forte ligação com os jesuítas, mostrando, desde cedo, grande interesse pela guerra e pela religião. Promoveu expedições à África, desaparecendo durante a batalha de Alcácer Quibir contra os mouros, em 1578. A partir de seu desaparecimento, nasceu a lenda conhecida por sebastianismo, em função do não aparecimento de seu corpo e da crença dos portugueses de que o rei não teria morrido e retornaria. Note-se que o sebastianismo, isto é, a ideia do advento de um rei libertador, não se limitou à fé no regresso de d. Sebastião, envolvendo, também, um conjunto de temas messiânicos sucessivamente reelaborados em contextos de crise e de indefinição política em Portugal. Formulado pela primeira vez nas Trovas, do sapateiro Gonçalo Anes (o Bandarra), em meados do século XVI, o mito de um rei salvador reapareceu durante o período filipino, sendo em vários momentos encarnado por figuras que se fizeram passar por d. Sebastião. Após a Restauração (1640), o padre Antônio Vieira continuou a divulgar os textos do Bandarra e ampliou esta profecia com a ideia de um Quinto Império português (elaboração messiânica que reservava para a Coroa lusa, sob o comando de d. João IV, o destino de ser a continuadora dos quatro grandes impérios da Antiguidade), associando temas históricos e bíblicos. Depois de d. João IV, o ideário criado em torno de d. Sebastião foi sucessivamente identificado com d. Afonso VI, d. Pedro II e d. João V, reaparecendo, ainda, no contexto das invasões francesas e no miguelismo. Para o povo, o sebastianismo tornou-se a expressão de um desejo persistente de libertação da miséria e opressão quotidianas.

[8] FOLHA DE FLANDRES: folha de ferro estanhado utilizada na fabricação de diversos objetos como utensílios domésticos. Também desse material eram feitas as máscaras usadas pelos escravos no Brasil, como forma de castigo ou para evitar o “vício do álcool”. Na mesma época, era empregada na confecção de padrões de pesos e medidas.

[9] PÉRFIDA USURPAÇÃO DOS FRANCESES: a invasão a Portugal pelos franceses aconteceu em decorrência da guerra que Napoleão Bonaparte movia contra a Inglaterra pela hegemonia no continente europeu. No campo econômico, uma das principais medidas de Napoleão para enfraquecer os britânicos foi a decretação do bloqueio continental em 1806. Tal medida previa a proibição de quaisquer laços comerciais com os ingleses às nações aliadas a França, sob pena de terem seus territórios invadidos por seus temíveis exércitos, incluindo os lusitanos. Diante da não adesão portuguesa ao bloqueio e, ao contrário, da reafirmação dos compromissos com a potência britânica, tropas francesas, comandadas pelo general Junot, entraram em Portugal em novembro de 1807, contando com o reforço da aliança firmada entre Espanha e França. Como consequência, a corte e a família real portuguesa transferiram-se para o Brasil naquele mesmo ano. Uma vez no Brasil, d. João declarou guerra à França. Após importante vitória na batalha do Buçaco em 1810, sob o comando do general inglês Arthur Wellesley, duque de Wellington, os franceses foram definitivamente expulsos de Portugal pelas tropas anglo lusitanas em 1811.

[10] MERCÊ: o mesmo que graça, benefício, tença e donativos. Na sociedade do Antigo Regime, a concessão de mercês era um direito exclusivo do soberano, decorrente do seu ofício de reinar. Cabia ao monarca premiar o serviço de seus súditos, de forma a incentivar os feitos em benefício da Coroa. Desse modo, receber uma mercê significava ser agraciado com algum favor (concessão de terras, ofícios na administração real, recompensas monetárias), condecoração ou título pelo rei, os quais eram concedidos sob os mais variados pretextos. Em 1808, após a chegada da Corte portuguesa ao Brasil, foi criada a Secretaria do Registro Geral das Mercês, subordinada à Secretaria de Estado dos Negócios do Brasil, quando da recriação, no Rio de Janeiro, dos órgãos da administração do Império português. Tinha por competência o registro dos títulos de nobreza e de fidalguia concedidos como graça, benefício e recompensa pelo monarca. As formas mais frequentes de mercês eram os títulos de nobreza e fidalguia, com as terras e tenças correspondentes, os hábitos das Ordens Honoríficas, cargos e posições hereditários. A concessão de mercês era também uma forma do monarca balancear os privilégios entre seus súditos, mantendo os bons serviços prestados por quem já havia conquistado alguma graça e incentivando o bom trabalho dos que almejavam obtê-las. Com a transferência da Corte da Europa para a América, poder-se-ia crer que os súditos da terra passariam a obter mais mercês, mas a hierarquia que havia entre a metrópole e a colônia, reproduzida na concessão de benefícios acabaria por se manter na colônia, mesmo depois da elevação a Reino Unido. Poucos títulos de nobreza foram concedidos, uma vez que na América não havia a nobreza de sangue, de linhagem, mas somente a concedida por grandes favores prestados ao reino, políticos ou militares. Entre as ordens honoríficas observa-se que houve a concessão de mais títulos, mas a maioria de baixa patente ou menor importância, os mais altos graus ainda eram reservados para a nobreza metropolitana. Mesmo concedendo hábitos, títulos de cavaleiros, posições e cargos, as mercês reservadas aos principais da colônia eram inferiores àquelas reservadas aos grandes da metrópole.

[11] REAL ERÁRIO: instituição fiscal criada em Portugal, no reinado de d. José I, pelo alvará de 22 de dezembro de 1761, para substituir a Casa dos Contos. Foi o órgão responsável pela administração das finanças e cobrança dos tributos em Portugal e nos domínios ultramarinos. Sua fundação simbolizou o processo de centralização, ocorrido em Portugal sob a égide do marquês de Pombal, que presidiu a instituição como inspetor-geral desde a sua origem até 1777, com o início do reinado mariano. Desde o início, o Erário concentrou toda a arrecadação, anteriormente pulverizada em outras instâncias, padronizando os procedimentos relativos à atividade e serviu, em última instância, para diminuir os poderes do antigo Conselho Ultramarino. Este processo de centralização administrativa integrava a política modernizadora do ministro, cujo objetivo central era a recuperação da economia portuguesa e a reafirmação do Estado como entidade política autônoma, inclusive em relação à Igreja. No âmbito fiscal, a racionalização dos procedimentos incluiu também novos métodos de contabilidade, permitindo um controle mais rápido e eficaz das despesas e da receita. O órgão era dirigido por um presidente, que também atuava como inspetor-geral, e compunha-se de um tesoureiro mor, três tesoureiros-gerais, um escrivão e os contadores responsáveis por uma das quatro contadorias: a da Corte e da província da Estremadura; das demais províncias e Ilhas da Madeira; da África Ocidental, do Estado do Maranhão e o território sob jurisdição da Relação da Bahia e a última contadoria que compreendia a área do Rio de Janeiro, a África Oriental e Ásia. Por ordem de d. José I, em carta datada de 18 de março de 1767, o Erário Régio foi instalado no Rio de Janeiro com o envio de funcionários instruídos para implantar o novo método fiscal na administração e arrecadação da Real Fazenda. Ao longo da segunda metade do século XVIII, seriam instaladas também Juntas de Fazenda na colônia, subordinadas ao Erário e responsáveis pela arrecadação nas capitanias. A invasão napoleônica desarticulou a sede do Erário Régio em Lisboa. Portanto, com a transferência da Corte para o Brasil, o príncipe regente, pelo alvará de 28 de junho de 1808, deu regulamento próprio ao Erário Régio no Brasil, contemplando as peculiaridades de sua nova sede. Em 1820, as duas contadorias com funções ultramarinas foram fundidas numa só: a Contadoria Geral do Rio de Janeiro e da Bahia. A nova sede do Tesouro Real funcionou no Rio de Janeiro até o retorno de d. João VI para Portugal, em 1821.

[12] SISTEMA MÉTRICO DECIMAL: elaborado na França, após a Revolução Francesa, o sistema métrico decimal proposto pela Academia de Ciências de Paris, pretendia satisfazer a necessidade de padronização das centenas de unidades de pesos e medidas que havia no território francês, algumas com a mesma nomenclatura e valores que variavam conforme a localidade. Além disso, a conjuntura internacional de crescentes trocas comerciais colocava a premência de um sistema científico e unificado de pesos e medidas. Por estas razões, o novo sistema tinha como princípios a universalidade, já que poderia ser aplicado em qualquer país, e a simplicidade, já que adotava como única unidade o metro, correspondente à décima milionésima parte da quarta parte do meridiano terrestre. Implementado em 1795 na França, o sistema tornou-se obrigatório naquele país apenas a partir de 1840, para, em seguida, ser adotado em diversos países europeus. A demora na implantação do novo sistema explica-se pela resistência da população e dos comerciantes em se adequarem às mudanças de terminologia. Portugal viria a adotar o sistema francês, em 1852, atendendo decreto de d. Maria II, que previa um prazo de dez anos para que entrasse em vigor. No Brasil, já independente, o sistema métrico foi instituído por meio da lei imperial de 26 de junho de 1862, que previa a substituição dos antigos padrões pelos novos, também num período de dez anos. Em represália a tal determinação, houve manifestações em várias províncias do Nordeste, com quebra de pesos e balanças nas feiras, entre os anos de 1874 e 1875, num episódio que ficou conhecido como Revolta dos Quebra-Quilos.

[13] MENESES, D. FERNANDO MARIA DE SOUSA COUTINHO CASTELO BRANCO E (1776-1834): 14º conde de Redondo e 2º marquês de Borba. Filho do 13º conde de Redondo e 1º marquês de Borba, Tomé Xavier de Sousa Coutinho de Castelo Branco e Menezes, e de d. Margarida Teles da Silva, descendente dos 2os marqueses de Penalva. Considerado um mecenas da música e das artes, foi tenente-coronel da cavalaria, ocupando cargos importantes na administração do Reino: governador do reino; presidente do Real Erário (1810) e vedor da Casa Real. Recebeu ainda o título de 12.º senhor de Gouveia; a Grã-Cruz da Ordem de S. Tiago e da de N. Sr.ª da Conceição, além da nomeação de comendador de Santa Maria de Gundar (ou Gondar), na Ordem de Cristo.

[14] NOGUEIRA, RICARDO RAIMUNDO (1746-1827): professor, jurista e político português influente no início do século XIX, lecionou na Faculdade de Leis da Universidade de Coimbra de 1772 a 1802, além de assumir a direção da “Livraria do Estudo”, atualmente Biblioteca Geral da mesma universidade entre os anos de 1798 e 1802.   No governo luso, foi conselheiro de Estado, membro do Governo do Reino (1810) e membro da Regência do Reino (1810-1820), colocando-se a favor de Napoleão quando das invasões francesas a Portugal. Durante súplica à Junta dos Três Estados – órgão da administração central portuguesa –, em 22 de maio de 1808, pedia uma constituição semelhante ao do Imperador Bonaparte, deixando claras suas posturas políticas. Responsável pela redação do projeto oficial da constituição após a restauração do governo absoluto em Portugal, conservou-se avesso à separação dos poderes. Tal empreendimento foi, no entanto, reprovado.

[15] ALBUQUERQUE, D. CAETANO JOSÉ DE NORONHA E (1753-1829): primeiro conde de Peniche, título concedido por meio de carta régia do príncipe regente d. João, datada de 6 de dezembro de 1806. Foi membro do Conselho de Fazenda, da Academia Real das Ciências de Lisboa, da Junta do Tabaco, governador e capitão-mor do Algarve e um dos governadores do Reino em 1818. Entre os vários cargos que desempenhou na Casa Real, merece destaque o de chanceler das casas da Rainha e do Infantado. Foi condecorado como Grão-Cruz da Ordem de Cristo e de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa.

[16] MENDONÇA, JOÃO ANTÔNIO SALTER DE (1746-1825): nascido em Pernambuco, formou-se em Direito pela Universidade de Coimbra. Retorna ao Brasil, onde foi nomeado desembargador da Relação do Rio de Janeiro, por decreto de 17 de dezembro de 1772. Ainda nesta cidade, exerceu os cargos de ouvidor-geral do Cível, procurador da Coroa e da Fazenda Real, deputado da Fazenda, porteiro e guarda-mor da Alfândega. Em 1779, foi transferido para a Relação do Porto, ocupando os cargos de procurador fiscal e conservador da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro. Em 1789, é nomeado para desembargador da Casa da Suplicação de Lisboa. Em 18 de Fevereiro de 1799, assume o cargo de procurador da Coroa, que exerce concomitante com o de desembargador do Desembargo do Paço, a partir de 1802. Ao longo da vida, ocupa diversos outros cargos e funções públicas, entre eles, o de chanceler da Casa da Suplicação (1812), guarda-mor do Real Arquivo da Torre do Tombo (1813), presidente da Comissão do Exame dos Forais e Melhoramentos da Agricultura (1812) e presidente da Comissão da Nova Reforma de Pesos e Medidas (1812). Com a transferência da família Real para o Brasil, faz parte da regência nomeada por d. João VI, desempenhando as funções de secretário de Estado dos Negócios do Reino e da Fazenda, permanecendo nessas funções de 1807 até 1820. Também neste ano, recebe o título de 1° visconde de Azurara.

 

Sugestões para usos em sala de aula

Terceiro ciclo 

- Eixo Temático: História das Relações Sociais, da Cultura e do Trabalho
- Subtema:  "As relações sociais e a natureza" 
- Natureza e povos indígenas na visão dos europeus, exploração econômica de recursos naturais pelos colonizadores europeus, agricultura de subsistência e comercial, a conquista, a ocupação e a produção e a extração de riquezas naturais.

Quarto ciclo

- Eixo Temático: História das Representações e das Relações de Poder
- Subtema: Nações, povos, lutas, guerras e revoluções
- Administração política colonial, coroa portuguesa no Brasil

A Academia Real e a Loteria

Decreto do príncipe regente d. João, sobre a interrupção da loteria que ajudava financeiramente à Academia Real das Ciências de Lisboa, impossibilitando a continuação de seus trabalhos científicos "gloriosos e úteis". Este faz uma mercê de 4:800 anuais à Academia, como forma de demonstrar sua satisfação com a promoção do progresso nas ciências e nas artes. A mercê será paga pelo Cofre do Subsídio Literário, sendo responsável pelo pagamento o tesoureiro mor do Real Erário. Externando sua preocupação com a instituição, o príncipe realça que a Academia estará sob sua proteção, dada sua evidente utilidade.

 

Conjunto documental: Secretaria de Estado do Ministério do Reino.
Notação: Caixa 724, pct. 01, pacotilha 6, 13.
Título do fundo ou coleção: Negócios de Portugal.
Código de fundo: 59
Argumento de pesquisa: Academia Real das Ciências de Lisboa
Data do documento: 4 de novembro de 1799
Local: Palácio de Mafra, Portugal
Folha: -

Tendo consideração a que a Academia Real das Ciências[1] da cidade de Lisboa[2], em consequência de haver-se interrompido a continuação da loteria[3] que eu havia permitido se fizesse a benefício da Santa Casa da Misericórdia[4], do Hospital Real de São José[5], e da mesma academia; se acha destituída dos indispensáveis meios de continuar os trabalhos científicos, em que tão útil e gloriosamente se tem empregado por espaço de vinte anos: E querendo dar-lhe novas demonstrações e provas da minha real benevolência, e da satisfação com que tenho presenciado o seu zelo e eficácia em promover os progressos das ciências e artes, que maiores utilidades podem trazer à nação portuguesa e ao meu real serviço: Hei por bem fazer-lhe mercê[6] da quantia de 4:800 réis[7] anuais por hora, que lhe serão pagos pelo Cofre do Subsídio Literário[8] aos quartéis, por mão do tesoureiro-mór do meu real erário, enquanto eu não mandar o contrário e não for servido tomar a este respeito novas providências, que firmem de uma vez, assim a subsistência como a organização e ordem de uma corporação, cuja evidente utilidade me determinou a tomá-la debaixo da minha real e imediata proteção de que ela se tem feito tão benemérita. O marquês mordomo mór e presidente do meu real erário[9] o tenha assim entendido e faça executar: Palácio de Mafra[10] 4 de novembro de 1799.                

 

 

[1] ACADEMIA REAL DAS CIÊNCIAS DE LISBOA: fundada em 24 de dezembro de 1779, no início do reinado de d. Maria I, pelo duque de Lafões e pelo abade Correia da Serra. Embora consagrado como “viradeira” em razão de um suposto revisionismo em relação ao reformismo pombalino, o reinado mariano ainda é marcado pela aliança entre as ideias iluministas, os princípios da fisiocracia e o mercantilismo que caracterizou o período anterior. A Academia Real configura-se como espaço privilegiado para a elaboração de projetos e memórias vinculados a um pensamento econômico no qual a ênfase nas “Artes e na Agricultura” como saída para a crise parece levar a uma adesão incondicional à fisiocracia. No entanto, como adverte o historiador Fernando Novais no estudo Portugal e Brasil na crise do Antigo Sistema Colonial, trata-se de um ecletismo no qual "o pragmatismo cientificista lastreava o mercantilismo". Essa formulação se manifestou em uma prática científica a serviço do Estado na qual se identifica o primado da experiência sobre os sistemas, a defesa de um saber utilitário, a aplicação do conhecimento na solução de problemas práticos relacionados à economia, à cultura e à sociedade portuguesas. Tais premissas apontam para o papel que a instituição cumpriria como instrumento do Estado português no redirecionamento de sua política colonial e na recuperação da economia lusa no último quartel do século XVIII. Congregando homens da ciência, naturalistas, literatos e outros intelectuais portugueses e estrangeiros, a Academia articulava o Reino aos círculos europeus, desempenhando papel fundamental na ciência, na medicina, na economia e na literatura em Portugal. Esteve à frente dos grandes debates nacionais como as reformas na educação pública, na padronização dos pesos e medidas, culminando na adoção do sistema métrico francês e na institucionalização da vacinação através da Instituição Vacínica. Espaço de diálogo entre os ilustrados luso-brasileiros a Academia privilegiava o conhecimento científico voltado para a utilização racional da natureza a fim de atingir o progresso material, principalmente através das colônias, o que a levou a patrocinar viagens e expedições filosóficas às possessões portuguesas com a finalidade de conhecer o território, demarcar limites e realizar um “inventário” da natureza do Novo Mundo, enviando remessas da fauna e flora local para catalogação nos museus de história natural da Europa.

[2] LISBOA: capital de Portugal, sua origem como núcleo populacional é bastante controversa. Sobre sua fundação, na época da dominação romana na Península Ibérica, sobrevive a narrativa mitológica feita por Ulisses, na Odisseia de Homero, que teria fundado, em frente ao estuário do Tejo, a cidade de Olissipo – como os fenícios designavam a cidade e o seu maravilhoso rio de auríferas areias. Durante séculos, Lisboa foi romana, muçulmana, cristã. Após a guerra de Reconquista e a formação do Estado português, inicia-se, no século XV, a expansão marítima lusitana e, a partir de então, Portugal cria núcleos urbanos em seu império, enquanto a maioria das cidades portuguesas era ainda muito acanhada. O maior núcleo era Lisboa, de onde partiram importantes expedições à época dos Descobrimentos, como a de Vasco da Gama em 1497. A partir desse período, Lisboa conheceu um grande crescimento econômico, transformando-se no centro dos negócios lusos. Como assinala Renata Araújo em texto publicado no site O Arquivo Nacional e a história luso-brasileira (http://historialuso.arquivonacional.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=3178&Itemid=330), existem dois momentos fundadores na história da cidade: o período manuelino e a reconstrução pombalina da cidade após o terremoto de 1755. No primeiro, a expansão iniciada nos quinhentos leva a uma nova fase do desenvolvimento urbano, beneficiando as cidades portuárias que participam do comércio, enquanto são elas mesmas influenciadas pelo contato com o Novo Mundo, pelas imagens, construções, materiais, que vinham de vários pontos do Império. A própria transformação de Portugal em potência naval e comercial provoca, em 1506, a mudança dos paços reais da Alcáçova de Lisboa por um palácio com traços renascentistas, de onde se podia ver o Tejo. O historiador português José Hermano Saraiva explica que o lugar escolhido como “lar da nova monarquia” havia sido o dos armazéns da Casa da Mina, reservados então ao algodão, malagueta e marfim que vinham da costa da Guiné. Em 1º de novembro de 1755, a cidade foi destruída por um grande terremoto, com a perda de dez mil edifícios, incêndios e morte de muitos habitantes entre as camadas mais populares. Caberia ao marquês de Pombal encetar a obra que reconstruiu parte da cidade, a partir do plano dos arquitetos portugueses Eugenio dos Santos e Manuel da Maia. O traçado obedecia aos preceitos racionalistas, com sua planta geométrica, retilínea e a uniformidade das construções. O Terreiro do Paço ganharia a denominação de Praça do Comércio, signo da nova capital do reino. A tarde de 27 de novembro de 1807 sinaliza um outro momento de inflexão na história da cidade, quando, sob a ameaça da invasão das tropas napoleônicas, se dá o embarque da família real rumo à sua colônia na América, partindo no dia 29 sob a proteção da esquadra britânica e deixando, segundo relatos, a população aturdida e desesperada, bagagens amontoadas à beira do Tejo, casas fechadas, como destacam os historiadores Lúcia Bastos e Guilherme Neves (Alegrias e infortúnios dos súditos luso-europeus e americanos: a transferência da corte portuguesa para o Brasil em 1807. Acervo, Rio de Janeiro, v.21, nº1, p.29-46, jan/jun 2008). No dia 30 daquele mês, o general Junot tomaria Lisboa, só libertada no ano seguinte mediante intervenção inglesa.

[3] LOTERIA: usualmente conhecida como jogo de azar, por meio de bilhetes numerados ou frações destes com o fim de se obterem prêmios pecuniários que são indicados por sorteios. Sua criação em Portugal data do final do século XVII, quando já estava instituída em alguns países da Europa. As loterias foram criadas com o objetivo de arrecadar receita para operações financeiras, principalmente visando reformar a moeda e fazer circular o dinheiro existente no Reino. D. Pedro II, rei de Portugal de 1683 a 1706, em carta régia datada de 4 de maio de 1688, criou a primeira loteria portuguesa, chamada loteria real. Em 1805, o príncipe regente d. João VI decreta a mudança de definição de loteria real para loteria nacional. Ao estado cabia a prerrogativa de autorizar a realização de loterias, em geral concedida a instituições beneficentes e científicas. Um dos destinos dos recursos obtidos com tais loterias foi a Academia Real das Ciências de Lisboa, instituição científica criada em 1779. O 1º duque de Lafões, seu sócio fundador, foi o responsável por ser destinada à academia, por diversas vezes, parte das receitas das loterias, principalmente após 1799, quando o príncipe d. João VI arbitrou à instituição 4.800.000 réis anualmente.

[4] SANTA CASA DA MISERICÓRDIA: irmandade religiosa portuguesa criada em 1498, em Lisboa, pela rainha Leonor de Lencastre. Era composta, inicialmente, por cem irmãos, sendo metade nobres e os demais plebeus. Dedicada à Virgem Maria da Piedade, a irmandade adotou como símbolo a virgem com o manto aberto, representando proteção aos poderes temporal e secular e aos necessitados. Funcionava como uma organização de caridade prestando auxílio aos doentes e desamparados, como órfãos, viúvas, presos, escravos e mendigos. Entre as suas realizações, destaca-se a fundação de hospitais. Segundo o historiador Charles Boxer, eram sete os deveres da Irmandade: “dar de comer a quem tem fome; dar de beber a quem tem sede; vestir os nus; visitar os doentes e presos; dar abrigo a todos os viajantes; resgatar os cativos e enterrar os mortos” (O império marítimo português. 2ª ed., Lisboa: Edições 70, 1996, p. 280). A instituição contou com a proteção da Coroa portuguesa que, além do auxílio financeiro, lhe conferiu privilégios, como o direito de sepultar os mortos. Enfrentando dificuldades financeiras, a Mesa da Misericórdia e os Hospitais Reais de Enfermos e Expostos conseguiram que a rainha d. Maria I lhes concedesse a mercê de instituir uma loteria anual, através do decreto de 18 de novembro de 1783. Cabe destacar que os lucros das loterias se destinavam, também, as outras instituições pias e científicas. Inúmeras filiais da Santa Casa de Misericórdia foram criadas nas colônias do Império português, todas com a mesma estrutura administrativa e os mesmos regulamentos. A primeira Santa Casa do Brasil foi fundada na Bahia, ainda no século XVI. No Rio de Janeiro, atribui-se a criação da Santa Casa ao padre jesuíta José de Anchieta, por volta de 1582, para socorrer a frota espanhola de Diogo Flores de Valdez atacada por enfermidades. A irmandade esteve presente, também, em Santos, Espírito Santo, Vitória, Olinda, Ilhéus, São Paulo, Porto Seguro, Sergipe, Paraíba, Itamaracá, Belém, Igarassu e São Luís do Maranhão. A Santa Casa constituiu a mais prestigiada irmandade branca dedicada à ajuda dos doentes e necessitados no Império luso-brasileiro, desempenhando serviços socais como a concessão de dotes, o abrandamento das prisões e a organização de sepultamentos. Os principais hospitais foram construídos e administrados por essa irmandade, sendo esta iniciativa gerada pelas precárias condições em que viviam os colonos durante o período inicial da ocupação territorial brasileira. A reunião do corpo diretivo da irmandade da Santa Casa da Misericórdia, responsável pela administração desta associação, era chamada Mesa da Misericórdia.

[5] HOSPITAL‌ ‌REAL‌ ‌DE‌ ‌SÃO‌ ‌JOSÉ: ‌‌o‌ ‌antigo‌ ‌Hospital‌ ‌Real‌ ‌de‌ ‌Todos‌ ‌os‌ ‌Santos,‌ ‌primeiro‌ ‌hospital‌ ‌de‌ ‌grande‌ ‌porte‌ ‌português,‌ ‌teve‌ ‌sua‌ ‌construção‌ ‌iniciada‌ ‌ainda‌ ‌no‌ ‌reinado‌ ‌de‌ ‌d.‌ ‌João‌ ‌II‌ ‌(1455-1495),‌ ‌após‌ ‌sucessivas‌ ‌autorizações‌ ‌obtidas‌ ‌junto‌ ‌aos‌ ‌papas‌ ‌Sisto‌ ‌IV,‌ ‌Inocêncio‌ ‌VIII‌ ‌e‌ ‌Alexandre‌ ‌VI,‌ ‌para‌ ‌congregar‌ ‌diversos‌ ‌hospitais‌ ‌da‌ ‌cidade‌ ‌de‌ ‌‌Lisboa‌ ‌‌em‌ ‌um‌ ‌único‌ ‌estabelecimento.‌ ‌A‌ ‌inauguração,‌ ‌entretanto,‌ ‌ocorreu‌ ‌apenas‌ ‌em‌ ‌1504,‌ ‌sob‌ ‌o‌ ‌governo‌ ‌de‌ ‌‌d.‌ ‌Manuel‌ ‌I‌ ‌(1469-1521).‌ ‌Resultado‌ ‌da‌ ‌fusão‌ ‌de‌ ‌diversas‌ ‌instituições‌ ‌de‌ ‌assistência,‌ ‌o‌ ‌hospital‌ ‌refletia‌ ‌um‌ ‌período‌ ‌de‌ ‌mudança‌ ‌no‌ ‌que‌ ‌tange‌ ‌o‌ ‌papel‌ ‌do‌ ‌Estado‌ ‌absolutista‌ ‌como‌ ‌promotor‌ ‌e‌ ‌gestor‌ ‌da‌ ‌assistência‌ ‌pública,‌ ‌exercida‌ ‌até‌ ‌então‌ ‌pela‌ ‌Igreja.‌ ‌No‌ ‌período‌ ‌medieval,‌ ‌os‌ ‌estabelecimentos‌ ‌de‌ ‌assistência‌ ‌como‌ ‌albergarias,‌ ‌mercearias,‌ ‌gafarias‌ ‌e‌ ‌hospitais,‌ ‌em‌ ‌sua‌ ‌maioria‌ ‌administrados‌ ‌por‌ ‌ordens‌ ‌religiosas‌ ‌e‌ ‌particulares,‌ ‌exerciam‌ ‌principalmente‌ ‌funções‌ ‌de‌ ‌recolhimento,‌ ‌hospício‌ ‌e‌ ‌abrigo,‌ ‌enquanto‌ ‌o‌ atendimento‌ ‌médico‌ ‌era‌ ‌prioritariamente‌ ‌destinado‌ ‌ao‌ ‌espaço‌ ‌domiciliar.‌ ‌No‌ ‌início‌ ‌do‌ ‌século‌ ‌XVI,‌ ‌atendendo‌ ‌às‌ ‌necessidades‌ ‌da‌ ‌crescente‌ ‌população‌ ‌urbana,‌ ‌e‌ ‌refletindo‌ ‌a‌ ‌centralização‌ ‌do‌ poder‌ ‌político‌ ‌na‌ ‌figura‌ ‌do‌ ‌rei,‌ ‌foram‌ ‌criados‌ ‌hospitais‌ ‌gerais‌ ‌nas‌ ‌principais‌ ‌cidades‌ ‌portuguesas,‌ sob‌ ‌controle‌ ‌régio.‌ ‌Além‌ ‌dos‌ ‌doentes,‌ ‌a‌ ‌exemplo‌ ‌das‌ ‌instituições‌ ‌de‌ ‌assistência‌ ‌da‌ ‌época,‌ ‌o‌ hospital‌ ‌abrigava‌ ‌crianças‌ ‌abandonadas‌ ‌(expostos),‌ ‌mendigos‌ ‌e‌ ‌peregrinos,‌ ‌embora‌ ‌não‌ ‌fossem‌ admitidos‌ ‌os‌ ‌portadores‌ ‌de‌ ‌doenças‌ ‌incuráveis‌ ‌e‌ ‌vítimas‌ ‌de‌ ‌peste.‌ ‌A‌ ‌instituição‌ ‌contava‌ ‌com‌ enfermarias‌ ‌separadas‌ ‌para‌ ‌homens‌ ‌e‌ ‌mulheres,‌ ‌uma‌ ‌“casa‌ ‌de‌ ‌doidos”,‌ ‌a‌ ‌casa‌ ‌de‌ ‌expostos‌ ‌e‌ instalações‌ ‌para‌ ‌nobres.‌ ‌No‌ ‌ano‌ ‌de‌ ‌1564,‌ ‌através‌ ‌de‌ ‌carta‌ ‌régia,‌ ‌o‌ ‌hospital‌ ‌passa‌ ‌a‌ ‌ser‌ ‌de‌ ‌responsabilidade‌ ‌da‌ ‌Misericórdia‌ ‌de‌ ‌Lisboa.‌ ‌Tendo‌ ‌parte‌ ‌de‌ ‌suas‌ ‌instalações‌ ‌destruídas‌ ‌por‌ ‌um‌ incêndio‌ ‌decorrente‌ ‌do‌ ‌famoso‌ ‌terremoto‌ ‌de‌ ‌que‌ ‌a‌ ‌cidade‌ ‌de‌ ‌Lisboa‌ ‌é‌ ‌palco‌ ‌em‌ ‌1755,‌ ‌seus‌ internos‌ ‌são‌ ‌transferidos‌ ‌pelo‌ ‌Marquês‌ ‌de‌ ‌Pombal,‌ ‌em‌ ‌1775,‌ ‌para‌ ‌o‌ ‌Colégio‌ ‌de‌ ‌Santo‌ ‌Antão,‌ ‌antiga‌ ‌Casa‌ ‌da‌ ‌Companhia‌ ‌de‌ ‌Jesus,‌ ‌passando‌ ‌a‌ ‌receber‌ ‌o‌ ‌nome‌ ‌de‌ ‌Hospital‌ ‌Real‌ ‌de‌ ‌São‌ ‌José,‌ ‌em‌ ‌honra‌ ‌do‌ ‌rei‌ ‌‌d.‌ ‌José‌ ‌I‌.‌ ‌

[6]MERCÊ: o mesmo que graça, benefício, tença e donativos. Na sociedade do Antigo Regime, a concessão de mercês era um direito exclusivo do soberano, decorrente do seu ofício de reinar. Cabia ao monarca premiar o serviço de seus súditos, de forma a incentivar os feitos em benefício da Coroa. Desse modo, receber uma mercê significava ser agraciado com algum favor (concessão de terras, ofícios na administração real, recompensas monetárias), condecoração ou título pelo rei, os quais eram concedidos sob os mais variados pretextos. Em 1808, após a chegada da Corte portuguesa ao Brasil, foi criada a Secretaria do Registro Geral das Mercês, subordinada à Secretaria de Estado dos Negócios do Brasil, quando da recriação, no Rio de Janeiro, dos órgãos da administração do Império português. Tinha por competência o registro dos títulos de nobreza e de fidalguia concedidos como graça, benefício e recompensa pelo monarca. As formas mais frequentes de mercês eram os títulos de nobreza e fidalguia, com as terras e tenças correspondentes, os hábitos das Ordens Honoríficas, cargos e posições hereditários. A concessão de mercês era também uma forma do monarca balancear os privilégios entre seus súditos, mantendo os bons serviços prestados por quem já havia conquistado alguma graça e incentivando o bom trabalho dos que almejavam obtê-las. Com a transferência da Corte da Europa para a América, poder-se-ia crer que os súditos da terra passariam a obter mais mercês, mas a hierarquia que havia entre a metrópole e a colônia, reproduzida na concessão de benefícios acabaria por se manter na colônia, mesmo depois da elevação a Reino Unido. Poucos títulos de nobreza foram concedidos, uma vez que na América não havia a nobreza de sangue, de linhagem, mas somente a concedida por grandes favores prestados ao reino, políticos ou militares. Entre as ordens honoríficas observa-se que houve a concessão de mais títulos, mas a maioria de baixa patente ou menor importância, os mais altos graus ainda eram reservados para a nobreza metropolitana. Mesmo concedendo hábitos, títulos de cavaleiros, posições e cargos, as mercês reservadas aos principais da colônia eram inferiores àquelas reservadas aos grandes da metrópole.

[7] RÉIS: moeda portuguesa utilizada desde a época dos descobrimentos (séculos XV e XVI). Tratava-se de um sistema de base milesimal, cuja unidade monetária era designada pelo mil réis, enquanto o réis designava valores fracionários. Vigorou no Brasil do início da colonização (século XVI) até 1942, quando foi substituída pelo cruzeiro.

[8]SUBSÍDIO LITERÁRIO: criado pelo alvará de 10 de novembro de 1772, consistiu em um imposto destinado a custear as reformas no campo da instrução pública promovidas pelo marquês de Pombal, arcando com o pagamento de mestres e professores das escolas menores públicas de todos os reinos e territórios de Portugal e ultramar. Seriam taxados o vinho, a aguardente e o vinagre dos reinos de Portugal e das ilhas dos Açores e da Madeira; na América e na África, a aguardente e as carnes de corte (frescas); e na Ásia, todas as aguardentes produzidas. Este subsídio consistia no pagamento de um real em cada canada de vinho, de 140 réis em cada canada de aguardente, de 160 réis por cada pipa de vinagre. Para a cobrança do imposto nas terras do Brasil eram responsáveis as Juntas da Real Fazenda instaladas em algumas capitanias. Após realizar a coleta do imposto, pagamento dos mestres e professores, os responsáveis teriam que enviar o saldo existente para Portugal. O sistema de coleta do imposto era realizado semestralmente e os valores eram anotados, assim como o nome do produtor, o local em que morava, a quantidade do produto manifestado e quando não produziam, os contribuintes também deveriam justificar o fato. O alvará estabelecia a unificação das medidas a serem usadas e as punições para os que tentassem sonegar o imposto, o que ocorria com frequência. Esta coleta substituiria todas as anteriores sobre os gêneros citados, muito embora os recursos arrecadados não fossem exclusivos para a manutenção das escolas e dos professores, além de não terem sido usados corretamente. No Brasil, a extinção deste imposto se deu em 1839, mas já em 1827 era fato notório que os valores coletados eram insuficientes para manter as escolas estabelecidas.

[9]REAL ERÁRIO:  instituição fiscal criada em Portugal, no reinado de d. José I, pelo alvará de 22 de dezembro de 1761, para substituir a Casa dos Contos. Foi o órgão responsável pela administração das finanças e cobrança dos tributos em Portugal e nos domínios ultramarinos. Sua fundação simbolizou o processo de centralização, ocorrido em Portugal sob a égide do marquês de Pombal, que presidiu a instituição como inspetor-geral desde a sua origem até 1777, com o início do reinado mariano. Desde o início, o Erário concentrou toda a arrecadação, anteriormente pulverizada em outras instâncias, padronizando os procedimentos relativos à atividade e serviu, em última instância, para diminuir os poderes do antigo Conselho Ultramarino. Este processo de centralização administrativa integrava a política modernizadora do ministro, cujo objetivo central era a recuperação da economia portuguesa e a reafirmação do Estado como entidade política autônoma, inclusive em relação à Igreja. No âmbito fiscal, a racionalização dos procedimentos incluiu também novos métodos de contabilidade, permitindo um controle mais rápido e eficaz das despesas e da receita. O órgão era dirigido por um presidente, que também atuava como inspetor-geral, e compunha-se de um tesoureiro mor, três tesoureiros-gerais, um escrivão e os contadores responsáveis por uma das quatro contadorias: a da Corte e da província da Estremadura; das demais províncias e Ilhas da Madeira; da África Ocidental, do Estado do Maranhão e o território sob jurisdição da Relação da Bahia e a última contadoria que compreendia a área do Rio de Janeiro, a África Oriental e Ásia. Por ordem de d. José I, em carta datada de 18 de março de 1767, o Erário Régio foi instalado no Rio de Janeiro com o envio de funcionários instruídos para implantar o novo método fiscal na administração e arrecadação da Real Fazenda. Ao longo da segunda metade do século XVIII, seriam instaladas também Juntas de Fazenda na colônia, subordinadas ao Erário e responsáveis pela arrecadação nas capitanias. A invasão napoleônica desarticulou a sede do Erário Régio em Lisboa. Portanto, com a transferência da Corte para o Brasil, o príncipe regente, pelo alvará de 28 de junho de 1808, deu regulamento próprio ao Erário Régio no Brasil, contemplando as peculiaridades de sua nova sede. Em 1820, as duas contadorias com funções ultramarinas foram fundidas numa só: a Contadoria Geral do Rio de Janeiro e da Bahia. A nova sede do Tesouro Real funcionou no Rio de Janeiro até o retorno de d. João VI para Portugal, em 1821.

[10] PALÁCIO DE MAFRA: localizado na então vila de Mafra, em Lisboa, o Palácio Nacional de Mafra foi construído durante o faustoso reinado de d. João V (1706-1750). Ícone da arquitetura barroca em Portugal, o palácio compõe um conjunto arquitetônico que inclui uma das maiores bibliotecas europeias setecentistas, com cerca de 40.000 livros, além do convento, da basílica e dos carrilhões, num conjunto de 92 sinos. As obras iniciaram-se em 1717 sob a direção de João Frederico Ludovice, ourives alemão, que estudou arquitetura na Itália. O projeto, que previa inicialmente a construção de um convento destinado à Ordem dos Frades Arrábidos, acabou tomando vulto e tornando-se um palácio-mosteiro, símbolo da espetacularização do poder real. Entre os muitos materiais importados para construção do monumento, consta o ouro brasileiro, cuja exploração, atingia seu apogeu nas Minas Gerais. Embora não tenha funcionado como moradia habitual dos monarcas, o palácio hospedava a família real por ocasião de festas religiosas ou das caçadas. Durante a invasão francesa, em 1807, Mafra funcionou como uma base militar. Foi também desse palácio que o último rei português, d. Manuel II, fugiu para o exílio com a proclamação da república, em 1910.

 

Sugestões para usos em sala de aula

Terceiro ciclo
Eixo Temático:

- História das Relações Sociais, da Cultura e do Trabalho
- Subtema:  "As relações sociais e a natureza"
- Natureza e povos indígenas na visão dos europeus, exploração econômica de recursos naturais pelos colonizadores europeus, agricultura de subsistência e comercial, a conquista, a ocupação e a - produção e a extração de riquezas naturais.


Quarto ciclo
Eixo Temático:

- História das Representações e das Relações de Poder
- Subtema: Nações, povos, lutas, guerras e revoluções
- Administração política colonial, coroa portuguesa no Brasil

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